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sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Francisco Rezek mostrará polêmicas da propriedade intelectual na Justiça




As questões mais polêmicas envolvendo a propriedade intelectual e as decisões judiciais, ainda não pacificadas, quando o assunto são os direitos autorais dos músicos, intérpretes e outros personagens ligados ao fenômeno da criação musical. Esse será um dos temas abordados pelo ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal e ex-juiz da Corte da Haia, o advogado Franciso Rezek, no painel sobre o Direito de Propriedade, que integra a programação da XXI Conferência Nacional dos Advogados. O evento será realizado de 20 a 24 de novembro deste ano na cidade de Curitiba.

Em entrevista na qual antecipou alguns dos pontos que pretende abordar na palestra "Questões Controvertidas da Propriedade Intelectual", Rezek afirmou que, atualmente, já é de conhecimento amplo as lições dadas pelo Supremo Tribunal Federal com relação ao domínio envolvendo a criação literária, as artes plásticas e a fotografia. A polêmica reside, no entanto, com relação ao direito autoral relacionado à música, aquele que, segundo o advogado, o Poder Judiciário mais comete erros.

"Ainda se vê, a todo momento, decisões judiciais disparatadas, que parecem ignorar o direito autoral do músico e parecem acreditar que o músico, dotado pelo Deus da arte e da criação, deveria compartilhar isso gratuitamente", afirmou Rezek, acrescentando que a polêmica reside em saber se os exploradores empresariais da música vão amealhar todo esse dinheiro sozinhos ou se vão dar uma parcela digna ao criador musical.

O painel do qual Francisco Rezek participará será realizado das 8h30 às 12h30 do dia 23 de novembro no Centro de Convenções Expo Unimed Positivo, onde acontecerá a Conferência. A expectativa da OAB Nacional é reunir 7 mil participantes, entre advogados, juristas, professores e estudantes de Direito. Serão 120 palestrantes, entre especialistas brasileiros e estrangeiros. As inscrições para a Conferência podem ser feitas no banner do evento no site www.oab.org.br.

A seguir a entrevista concedida por Francisco Rezek:

P - O que é propriedade intelectual, o tema que o senhor abordará durante a XXI Conferência Nacional dos Advogados? 

R - A propriedade intelectual é aquilo que resulta, para o criador, da obra de criação artística, literária, musical, da criação científica ou da criação no domínio da Medicina e da tecnologia. Tudo isso tem, hoje, sido corretamente coberto pelo Direito das diversas nações. Uma ou outra vez vemos algum confronto político transnacional se travar quando se fala na propriedade intelectual relacionada a produtos farmacêuticos, muito elementares no socorro à saúde de grandes massas humanas. Esses são produtos que resultaram da pesquisa feita por laboratórios internacionais muito bem dotados para a finalidade da pesquisa, porque isso também é da criação científica no domínio da Medicina, que querem auferir lucros muitas vezes desproporcionais. Países como o Brasil têm hoje, na cena internacional, desafiado abertamente, e com razão, certos abusos praticados não exatamente pelos criadores do produto científico patenteado, mas por grandes laboratórios. Por conta da criação que patrocinaram, essas empresas muitas vezes pretendem auferir um lucro exageradamente elevado se se considera que são medicamentos necessários no rigor da vida cotidiana de pessoas enfermas na maioria dos países.

P - Qual a questão mais controvertida atualmente quando se fala em propriedade intelectual?

R - O domínio que mais de perto nos diz respeito hoje como mais sensível em matéria de propriedade intelectual é o que tem a ver com os direitos autorais da música, envolvendo todo o fenômeno da criação musical: o compositor, a letra e a partitura, o arranjador e o intérprete. Esse direito autoral no campo da música vai até um certo número de décadas após a morte do autor. Depois disso a obra cai em domínio público. Quando falamos, por exemplo, na música contemporânea do Brasil, estamos falando não só nos compositores, arranjadores e intérpretes, mas também nas famílias dos sucessores daqueles que morreram nas últimas décadas e cujas obras ainda não caíram no domínio público. É a inspiração desse tipo de criação artística que mais dá dinheiro a todos aqueles que exploram empresarialmente a criação musical. Esse é o domínio onde mais circulam riquezas e é também o domínio em que o proprietário da sua criação é mais explorado, pirateado e aviltado de todas as maneiras.

P - O Supremo e as Cortes superiores tem apreciado processos envolvendo esse tipo de controvérsia corretamente, em sua opinião?

R - É exatamente esse domínio do direito autoral relacionado com a música aquele em que o Poder Judiciário comete mais erros. Aliás o único, eu creio. Em matéria de criação literária, no domínio das artes plásticas e da fotografia, o Supremo Tribunal Federal ensinou certas lições há tantas décadas que, hoje, não se identifica mais ninguém que não as tenha prendido e que já não proceda corretamente nesses domínios. No meio da música não. Ainda se vê, a todo momento, decisões judiciais disparatadas, que parecem ignorar o direito autoral do músico e parecem acreditar que o músico, dotado pelo Deus da arte e da criação, deveria compartilhar isso gratuitamente.

P - Qual o argumento que tem sido usado para ignorar o direito do autor? 

R - O do acesso do povo à cultura. Mas a questão não é essa porque o povo terá de qualquer maneira esse acesso. A questão é saber se os exploradores empresariais da música vão amealhar todo esse dinheiro sozinhos ou vão dar uma parcela digna ao criador musical. É isso o que mais se discute hoje nas várias instâncias da Justiça. É isso que tem produzido em juízo as decisões mais calamitosas à base da idéia extremamente arcaica de que o músico não tem o direito de ser corretamente remunerado pela sua criação e interpretação. Portanto, esse é o domínio mais polêmico e mais interessante que a Conferência de Curitiba vai discutir em novembro próximo.

P - Qual a importância de se discutir esse tema para o país?

R - Não acho que as diversas decisões erradas que foram tomadas até hoje no Poder Judiciário no tocante à propriedade intelectual no campo da música tenham resultado de alguma coisa mais sórdida do que a simples ignorância. A simples visão obtusa do fenômeno da criação musical e dos direitos que tem o autor não se dá exatamente em face do público, uma vez que este está sempre pagando para assistir e ouvir os espetáculos, mas em face dos empresários. Estes, em contato direto com o respectivo público, arrecadam somas que, no domínio da música, são muito mais significativas do que aquelas relacionadas à literatura escrita, à poesia, à arte gráfica e a outros domínios da criação. Em todos os níveis aconteceram erros nos últimos anos. O único especialista notório em matéria de direitos autorais que, vestido numa toga, já pisou em Brasília, foi o ministro do STJ, Carlos Alberto Menezes Direito. Ele ensinou lições incomparáveis a quem dela precisava. Ele foi para ao Supremo Tribunal Federal e, para a nossa extrema tristeza morreu precocemente. De modo que perdemos o único grande farol de conhecimento profundo da matéria do direito autoral relacionado á música e ficamos, hoje, sem ninguém especializado no assunto, contando apenas com o bom senso, a clarividência e o bom esclarecimento das cabeças dos juízes do Brasil.


Fonte: Conselho Federal da OAB (link para a postagem original)

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