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sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Resenha

O MODELO PARTIDÁRIO BRASILEIRO E A IMPORTÂNCIA DO PODER LEGISLATIVO NA CONSTRUÇÃO DE UM ESTADO DEMOCRÁTICO: a visão do doutrinador Manoel Gonçalves Ferreira Filho na obra “Sete vezes democracia”.

Giselle Borges Alves
Grupo de pesquisa em Direito Público
Faculdade INESC/CNEC - Unaí/MG
Publicação: 01.08.2011.



“A influência real do Parlamento decorre de seu prestígio. Esta não lhe advirá dos textos constitucionais que não tem energia própria. Não lhe advirá das armas, com que não conta. Somente poderá vir da confiança e do apoio do povo.”    
             (Manoel Gonçalves Ferreira Filho, 1977, p. 101)

INTRODUÇÃO
Este artigo apresenta inicialmente uma visão pormenorizada sobre os partidos políticos na democracia brasileira sob a visão do autor Manoel Gonçalves Ferreira Filho, exposta no capítulo III da obra “Sete vezes Democracia” publicada em 1977. As definições estão concentradas tanto da ciência jurídica como da ciência política acerca do panorama do sistema político-partidário brasileiro até meados da década de 1970, comparando-a com a evolução do pensamento sobre a participação política do cidadão no processo de construção do Poder Legislativo, apto a desenvolver-se de acordo com o modelo do Estado Constitucional, conforme revelado no capítulo IV da mesma obra.

1. A ANÁLISE SOBRE O PARTIDO POLÍTICO NA DEMOCRACIA BRASILEIRA
Manoel Gonçalves Ferreira Filho inicia a abordagem fazendo um paralelo sobre a Democracia e o partido político ressaltando as correntes ideológicas que permearam a história e que divergem quanto à importância deste último para a construção de um Estado democrático.
A primeira corrente, surgida nas ideias liberais do século XVIII, não era simpática com os partidos políticos, condenando-os. Entre os adeptos desta posição na América, estava o ex-presidente dos Estados Unidos, George Washington, para quem os partidos constituem uma ameaça aos Estados, pois dividem assembléias e conselhos, enfraquecem a administração pública, instigam animosidade, desconfiança, agitações, paixões e controvérsias. Na França, Rousseau foi o maior expoente. O pensador alertava sobre a “proscrição dos partidos, dos corpos intermediários, de todos os grupos que interpõem entre o indivíduo e o Estado”. Pela idéia apregoada por Rousseau, os partidos desviam os cidadãos do interesse geral para o interesse particular. Retiram a pureza da vontade geral.
A segunda corrente afirma que a Democracia está apesar dos partidos, sendo estes consagrados como um mal necessário em virtude das eleições. Para os adeptos desta corrente os partidos são apenas toleráveis como um meio de expansão da própria Democracia e, exatamente por isso, o Direito traçou proibições aos partidos antidemocráticos e à constituição de milícias partidárias.
Ferreira Filho (1977, p.59) cita as palavras de Maurice Duverger para tratar da ambiguidade tolerada por esta corrente quanto à essencialidade dos partidos políticos para o fortalecimento e expansão da Democracia:
Admitia-se com Duverger que ‘nas democracias os partidos são ambivalentes: de um lado, servem para organizá-las sem que nada possa substituí-los nesse papel; de outro, contêm em si mesmos um certo número de venenos capazes de destruí-las ou, ao menos, de deformá-las.
A terceira corrente traz os partidos como essenciais à democracia e surge como resultado da crítica à democracia representativa implantada na Inglaterra através do governo por parlamentares, a qual também gerou muitas críticas de Rousseau. Segundo Ferreira Filho (1977, p. 59-60) na democracia pelos partidos busca-se o “governo do povo e pelo povo e para o povo”. Tal não acontecia no sistema da democracia representativa, pois “o povo não se governa por meio de representantes, é governado por estes, conforme lhes aprouver”.
Na apresentação do modelo da democracia partidária, o autor afirma que se os partidos políticos estabelecerem um programa de governo e selecionarem candidatos comprometidos com esse programa, será possível transformar a eleição, de mera escolha de governantes, em seleção também de uma política de governo. Assim o povo escolheria um representante e a política a que este se devotará. (FERREIRA FILHO, 1977, p. 60)
Após a análise das correntes que averiguam a importância ou não dos partidos políticos na construção do Estado democrático, Ferreira Filho (1977) traça um esboço histórico do partido político no direito constitucional brasileiro, iniciando com a Constituição de 1946, onde pela primeira vez ocorreu a normatização dos partidos políticos, trazendo-os como imprescindíveis à democracia, porém consciente dos perigos que estes podem trazer às instituições. Na época verificou-se a necessidade da pluralidade de partidos e o Código Eleitoral concedeu a eles o monopólio das candidaturas, assim ninguém podia postular eleição sem a filiação partidária. Mas frise-se que ao mesmo tempo em que foi registrada a necessidade da pluralidade de partidos, o registro do Partido Comunista foi cassado, pois de acordo com a Constituição Federação de 1946, este foi considerado antidemocrático.
Com a necessidade da pluralidade a abertura foi automática e múltiplos eram os partidos na época da eclosão da Revolução de Março. Mas apesar da quantidade não possuíam coerência, disciplina interna e muito menos bases sólidas, características que eram indispensáveis para a consolidação destes. Também não apresentavam grandes diferenças de programas e eram eminentemente personalistas, ou seja, se constituíam em torno de homens e lideranças e não de idéias.
O grande número de partidos levou a divisão do eleitorado e, consequentemente, ao alargamento das bases dos pequenos partidos. De acordo com Ferreira Filho (1977), Pompeu de Sousa usou para caracterizar este período a expressão “processo de pequenização” dado a ampliação do número de pequenos partidos pelo território nacional. O resultado deste processo foi o surgimento de contradição entre as alianças nacionais, estaduais e municipais, com uma verdadeira incoerência do sistema, que se evidenciava ainda mais com a “coalização de partidos” para disputas de eleições. Estas “coalizões” eram muito similares às atuais coligações partidárias.
Outra característica comum do sistema eleitoral na época era a ausência da disciplina partidária aliada à falta de fidelidade programática, o que poderia resultar numa multiplicação ainda maior de partidos políticos. Dentro dos partidos não havia ideais comuns, ao contrário, várias alas e correntes políticas se misturavam. Ferreira Filho (1977) destaca que Pompeu de Sousa criou a expressão “decomposição partidária” para nominar essa falta de coerência interna.
Entretanto a Lei 4.740/1965 trouxe a reforma tão esperada para o sistema partidário. Foi a primeira lei orgânica dos partidos políticos e, de acordo com o autor, trouxe em seu cerne cinco ideias mestras: 1º) o programa como o princípio vital do partido; 2º) o enrijecimento da disciplina interna, com fulcro na eliminação de dissidências e infidelidades; 3º) a tendência a privilegiar as estruturas democráticas das agremiações, dando maior importância as convenções e bases dos partidos políticos; 4º) o financiamento partidário no intuito de evitar corruptores; e 5º) a redução do número de partidos. Estava configurada uma remodelação dos partidos políticos brasileiros imposta de baixo para cima.
Era mister organizar diretórios municipais, a partir de um número mínimo de filiados, para depois estruturar os regionais e, afinal, o diretório nacional. Este, porém, somente se constituiria depois de organizados onze diretórios regionais (art. 16, §3º). (FERREIRA FILHO, 1977, p. 63)
Mas pouco tempo após o advento da Lei 4.740/1965, o Ato Institucional nº 02 extinguiu os partidos políticos, inviabilizando a renovação paulatina destas instituições. De acordo com Ferreira Filho (1977), o objetivo era a organização imediata de novos partidos observando a lei orgânica: “Partia-se do marco zero, mas com a vantagem de romper com o passado”. A consequência é que por muito tempo ficou o país sem partidos políticos e foram criadas na verdade duas organizações com atribuições partidárias, a ARENA e o MDB. Nas palavras do autor, o que era para ser provisório tornou-se duradouro. Desta forma, há que se questionar a verdadeira intenção que havia na extinção dos partidos políticos pelo AI-02, afinal estava instalado um regime de exceção onde a propagação do debate não era bem-vinda.
Com o advento da Constituição de 1967 foram estabelecidos os princípios para organização, funcionamento e extinção dos partidos políticos. Entre os princípios temos (I) a pluralidade de partidos para um regime representativo e democrático; (II) a atribuição de personalidade jurídica; (III) a atuação permanente e sem vinculação com governos, entidades ou partidos estrangeiros; (IV) a fiscalização financeira; (V) a disciplina partidária; (VI) a atuação em âmbito nacional; (VII) o estabelecimento de um percentual de votos em um número mínimo de Estados tanto para a Câmara como para o Senado; e (VIII) a proibição de coligações partidárias. O principal objetivo do estabelecimento destes princípios foi proibir a multiplicação dos partidos políticos, mas conforme ressaltado pelo doutrinador, a Constituição de 1967 esqueceu que para conter esta multiplicação era necessário organizar o sistema eleitoral.
Um dos problemas do sistema eleitoral identificado pelo autor e, segundo ele, também reconhecido por Maurice Duverger na obra “Les Partis politiques”, era a eleição proporcional, uma vez que essa seria a principal geradora da multiplicidade de partidos independentes. (FERREIRA FILHO, 1977)
A Emenda Constitucional nº 01/1969, trouxe uma modificação e uma inovação ao diploma anterior. Como modificação estava a diminuição da percentagem exigida de votos para a criação dos partidos, com o objetivo de facilitar a criação destes. A inovação estava na implementação da fidelidade partidária. Na ótica de Ferreira Filho (1977) o parlamentar passou a ser visto como um “soldado do partido”, ocorrendo assim o rompimento com os princípios que regem o mandato representativo.
Em 1971 temos a edição da Lei 5.682, que logo ficou conhecida como a nova lei orgânica dos partidos políticos, mas não se afastou efetivamente das determinações da Emenda Constitucional nº 01 de 1969. Com o seu advento ocorre agora o fortalecimento do diretório em detrimento da convenção, inaugurando uma nova tendência. O controle partidário passa a ser de cima para baixo, na busca de uma centralização. (FERREIRA FILHO, 1977)
 
1.1. O Modelo Político Constitucional Brasileiro

Imperioso relembrar que a obra “Sete vezes Democracia” foi publicada antes da Constituição Brasileira de 1988, portanto os modelos apresentados pelo autor correspondem à Constituição 1967, vigente na época com as alterações da EC nº 01/69 e ao período do início da redemocratização brasileira, mas ainda em meio à repressão da ditadura militar.
Ao analisar a própria expressão “modelo político” o autor abraça duas vertentes:
Tanto pode designar as relações de fato que, num dado momento e lugar, existem entre os indivíduos, grupos e forças que controlam ou detêm poder – caso em que o modelo se espalha ou reconstitui o ser – como pode referir-se ao plano ou arranjo ideal pelo qual devem pautar-se essas relações para realização de determinados valores, caso em que o modelo se deseje modelar a realidade, mudando-a. (FERREIRA FILHO, 1977, p. 68)
Desta forma o “modelo” pode representar o presente e o futuro, ou seja, o ser e o dever-ser. Já a expressão “modelo constitucional”, de acordo com Ferreira Filho (1977, p. 69), “significa o arranjo que deve pautar as relações políticas, segundo a Constituição. [...] Toda Constituição é um planejamento por que se pretende modelar a organização e a vida de um Estado”.
Na análise empreendida o autor afirma que o modelo constitucional brasileiro adotado era da democracia pelos partidos. Assim, o povo só poderia participar do governo através dos partidos políticos. Dentro deste propósito, Ferreira Filho (1977, p. 68) faz o seguinte questionamento no texto: “Mas de que modo emana do povo o poder?” E o próprio autor responde: “O poder resulta de eleições em que o povo vota não em homens e sim em partidos, como se viu acima. Vota em candidatos de partidos que devem fielmente seguir o programa desses partidos”. Para o doutrinador o poder do povo está no Legislativo.
A partir destas constatações realizadas ainda sob a égide da ditadura militar brasileira, é possível verificar que de lá para cá muita coisa mudou e que no decorrer dos últimos anos, já em pleno século XXI, o povo tem se identificado mais com os representantes do Poder Executivo e aumentado o descrédito com relação àqueles que realmente representam, segundo o autor, a vontade geral (ou deveriam representar), o Poder Legislativo.
A crescente apatia política e a perda de legitimidade das instituições relacionadas com a democracia representativa (parlamentos, partidos, governos) também foram observadas por Mauro Almeida Noleto em estudo empreendido sobre a participação da Justiça Eleitoral na construção da democracia brasileira, intitulado “Justiça e Democracia”. Para Noleto (2008), tanto a apatia como a perda de legitimidade pode levar a um novo tipo de caudilhismo e/ou democracias plebiscitárias demagógicas, sujeitas a toda sorte de manipulações ideológicas.
Noleto (2008) menciona, ainda, que Norberto Bobbio apontou grande contraste entre os contornos ideais da democracia definida pelos fundadores do pensamento político moderno e a experiência histórica de sua realização. Desde a idealização da democracia moderna que se opôs aos regimes políticos anteriores (clássico e medieval) até a democracia contemporânea, as transformações descumpriram suas promessas originais. Bobbio aponta seis dívidas da democracia contemporânea: (I) a sobrevivência do poder invisível, (II) a permanência das oligarquias, (III) a permanência de corpos intermediários, (IV) a revanche da representação dos interesses, (V) a participação interrompida e (VI) o cidadão não educado. Entretanto o filósofo afirma que todas essas promessas não cumpridas não são degenerações do conceito, mas adaptações históricas motivadas pelas imposições da prática política, com exceção de uma: a sobrevivência de um poder invisível.
De acordo com Noleto (2008), o filósofo Norberto Bobbio define o poder invisível como aquele que não pode vir a público e revelar suas decisões e seus procedimentos. A falta dessa promessa, ou seja, da transparência do poder, corrompe a democracia muito mais do que a presença de grupos oligárquicos disputando espaço ou do avanço da representação de interesses corporativos sobre o princípio da representatividade política universal.
Ao analisar a viabilidade do modelo da democracia pelos partidos, adotado constitucionalmente pelo Brasil, Ferreira Filho (1977, p. 70) faz o seguinte questionamento: “A democracia pelos partidos é um modelo viável?”.
Com base nas conclusões da Ciência Política o autor afirma que essa resposta não é pacífica e nem provável, uma vez que não há uma formação humana equânime. A diversidade entre os variados grupos faz com que muitos deles estejam equidistantes dos problemas uns dos outros, muitas vezes ignorando e outras nem tomando conhecimento destas reais dificuldades. Somente uma minoria consegue uma inter-relação com os problemas gerais, ou seja, um contato com todos os grupos.
Para Ferreira Filho (1977, p. 70) o modelo da democracia pelos partidos só é viável se for conhecido em seu cerne, e resume:
Está no cerne desse modelo a idéia de que o povo irá guiar-se em suas opções eleitorais pelo programa dos partidos. Sopesará estes programas, escolherá o melhor, ou o que lhe parecer melhor, ao mesmo tempo, elegendo candidatos que se comprometem a realizá-lo. Assim, escolherá os homens que vão governar e a política que será executada por esse governo.
Diante da falta de compreensão deste modelo, o autor destaca que os partidos preferem deixar os problemas reais e guiarem-se em torno de ideologias e princípios, ou seja, programas abstratos que pouco solucionam problemas concretos. Arremata com o posicionamento de Karl Loewenstein, que afirma que os partidos elaboram programas de modo a não ofender nenhum grupo ou favorecer abertamente a todos, acomodar amplamente qualquer interesse. Desta forma, as decisões políticas são tomadas da opinião pública.
Seguindo as indagações acerca do modelo político constitucional adotado, Ferreira Filho (1977, p. 71) pergunta: “O individualismo nacional se coaduna com a vivência partidária que exige o modelo?” Para responder a questão cita as palavras de Frei Vicente do Salvador, para quem o povo brasileiro não “é republico, nem zela ou trata do bem comum, senão cada um do bem particular”. Ressalta com as palavras de Oliveira Viana, que mesmo as formas de solidariedade voluntária só aparecem em forma de “grandes entusiasmos coletivos” e todas as associações, não importa a espécie, possuem vida artificial e efêmera. A única solidariedade existente, segundo Oliveira Viana é a “solidariedade de clã”.
Disto resulta a pouca participação do brasileiro na vida partidária. A conseqüência é a deformação do sistema, com partidos oligárquicos, ou seja, representativos da dominação por pequenos grupos.
1.2. A necessidade da estruturação do partido político. 
Ferreira Filho (1977) distingue quatro tarefas dentro da missão do partido político na democracia brasileira: (I) a preparação política do povo; (II) a preparação dos candidatos; (III) a informação política; e (IV) a fixação do programa do partido.
Sobre a formação política o autor ressalta as idéias de Aristóteles e Montesquieu, resumindo-as na seguinte afirmação: “toda forma de governo presume uma determinada educação do povo”. E prossegue: “[...] Com efeito, os valores infundidos pela educação da juventude farão com que esse povo seja mais ou menos capaz de dar vida a determinadas instituições.” Para o doutrinador, os partidos devem ter o compromisso na difusão dos valores que inspiram a democracia, o apego à liberdade e à igualdade, o devotamento ao interesse geral e o espírito cívico, sendo estas algumas das tarefas do partido, mas não apenas sua. (FERREIRA FILHO, 1977, p. 73-74)
Acerca da formação dos candidatos, Ferreira Filho afirma que esta é uma das funções mais importantes do partido político. O ponto de partida deve ser a escolha daqueles que tem vocação, acrescentando-lhes o conhecimento da política e dos problemas de governo. O partido político deve verdadeiramente buscar a seleção dos mais aptos, mas sem descuidar da responsabilidade perante os eleitores, ou seja, a fidelidade do candidato ao programa e ideais do partido, o plano preestabelecido de ação política.
O programa do partido político é outra das tarefas imprescindíveis a essas organizações, uma vez que sua definição é essencial ao modelo adotado pela Constituição brasileira, o modelo da democracia pelo partido. Sendo assim, o programa do partido político não pode converter-se em generalidades ou ser uma declaração ideológica, deve ser preciso e exequível, estabelecido por uma assessoria de especialistas. Ferreira Filho exemplifica citando o modelo dos programas dos partidos políticos alemães.
Ao tratar da informação política, o autor ressalta o papel do partido político em informar o seu programa e ser opositor aos demais quando for necessário, pressupondo a ligação permanente entre o eleitorado e o governo. O partido deve ser mecanismo de transmissão entre governantes e opinião pública, com “[...] a divulgação do programa próprio e a crítica ao alheio, e defesa da ação governamental ou sua análise a fundo. Com isso a opinião irá sendo paulatinamente formada e não apenas nas vésperas de eleição.” (FERREIRA FILHO, 1977, p. 75)
Ao tratar do financiamento partidário Ferreira Filho (1977, p. 76) é enfático ao declarar que o modelo da democracia pelos partidos pressupõe que o Estado mantenha-os através de dotações distribuídas sem condições políticas. Em todo o decorrer da obra, demonstra ser favorável ao financiamento público do partido para evitar “conveniências imediatistas, ao sabor dos interesses particulares dos doadores.”
Na visão do autor a autenticidade dos partidos só poderá ser realmente sentida na medida em que se busque o estímulo à vinculação dos partidos com os anseios da comunidade, destacando que o sistema eleitoral que adota a representação proporcional não contribui para que nasça esse liame que é necessário na democracia pelos partidos: “O eleito, cujos votos vieram de toda parte, não está verdadeiramente ligado a grupo algum, não representa senão algumas idéias gerais.” (FERREIRA FILHO, 1977, p. 76)
Mas afirma que a EC nº 01/69 abriu a possibilidade da adoção de um sistema misto que não exclui a proporcionalidade global, mas permite a eleição distrital, e consequentemente o fortalecimento da representação e do partido. Finaliza sua análise abordando a visão de que na eleição distrital o partido político seria mais autêntico entre os eleitores e eleitos, aperfeiçoando assim a Democracia.
 
2. A ANÁLISE DO PODER LEGISLATIVO NA DEMOCRACIA

A fórmula de Montesquieu foi ressaltada por Ferreira Filho (1977, p. 81):
A existência de três poderes, Legislativo, Executivo e Judiciário, independentes e harmônicos, era, portanto, aos olhos dos iniciadores da Democracia moderna, instrumento necessário para um Estado que tivesse como objeto e razão de ser a liberdade dos cidadãos.
Para o autor, o Legislativo é o poder que tem origem tipicamente democrática, através da representação popular e da manifestação da vontade geral; sua égide está em ser o “guardião da liberdade” e a “voz da Democracia”. Mas apesar disso, os cidadãos que outorgam essa competência a estes representantes são os mesmos que não crêem na firmeza e no potencial deste poder. Contata-se que pouco mudou séculos depois da publicação da obra do autor. As palavras de Ferreira Filho (1977, p. 82) ainda soam muito atuais em pleno século XXI: “[...] O Parlamento é vítima de vilipêndio e escárnio, esvaziam-se em suas funções, pretende-se construir sem ele a Democracia. Não falte quem o considere inútil, dispensável, mero reduto da loquacidade improdutiva.”

2.1. O estudo empreendido sobre a ascensão, o apogeu e a decadência do Poder Parlamentar.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho associa como raiz do Legislativo atual as assembléias medievais, que surgiram da necessidade do governo de contar com a colaboração dos governados:
Os príncipes medievais se aperceberam de que, reunindo em torno de si as figuras mais destacadas e de maior influencia no país, podiam fazer-lhes conhecer as necessidades do Estado e, demonstrando-lhes a urgência das medidas em que eram chamados a consentir, levá-los a obter a colaboração ativa dos governados nos empreendimentos de interesse comum. [...] (FERREIRA FILHO, 1977, p. 83)
As assembléias medievais também se estabeleceram como meio de segurança para os governados contra o arbítrio dos príncipes. A mais importante delas foi a assembléia inglesa, que funcionava de maneira permanente, consequência do poder financeiro e político de deliberação e fiscalização, que em si resultou no poder legislativo do Parlamento inglês, sendo este modelo de democracia representativa a base inspiradora de Montesquieu e outros estudiosos. (FERREIRA FILHO, 1977)
Ao tratar da separação dos poderes, Ferreira Filho (1977, p. 86-87) afirma:
[...] convém dividir o poder para que os poderes surgidos desse fracionamento sirvam de limites, de freios e de contrapesos uns para os outros.
[...]
No modelo de Montesquieu, o elemento democrático teria lugar no Poder Legislativo. Este, é bem verdade, se estruturaria em duas câmaras, uma das quais destinada a representar a aristocracia, a nobreza, mas na outra estaria a representação popular, encontraria expressão o interesse comum. Entretanto, não concebia o mestre a representação popular como simples e mero porta-voz de reivindicações populares. Pretendia que os representantes fossem chamados a decidir segundo o interesse geral, pairando acima da luta de interesses particulares.
Diante destas observações é possível perceber que o modelo do Poder Legislativo elaborado por Montesquieu estruturado em duas câmaras, é o mesmo que está estruturado o Legislativo brasileiro atual. A primeira câmara destinada a representar a aristocracia, a nobreza, pode ser associada à realizada hoje pelo Senado Federal diante da representação dos Estados Federados; já a câmara destinada a representação popular ainda hoje é assim concebida, que no Brasil é representada pela Câmara dos Deputados e tal qual concebido inicialmente por Montesquieu, a Constituição Federal de 1988 trouxe o dever destes representantes do povo como o primado do interesse geral, o bem da coletividade.[1]
A partir do momento que a norma suprema de uma nação, no caso a brasileira, estabelece prerrogativas tão importantes ao Parlamento, entre elas a fiscalização das ações do Poder Executivo, o processo e julgamento contra o Presidente da República, a intervenção direta através da elaboração de leis nos setores sociais, econômicos, orçamentários, de comunicação e até mesmo dispor sobre o efetivo das Forças Armadas, entre outras matérias, percebe-se a importância dos representantes do povo e dos Estados Federados para a manutenção de um Estado Nacional voltado para a preponderância dos ideais que devem nortear qualquer nação que vise o desenvolvimento e, sobretudo, a boa qualidade da vida em sociedade. 
Ferreira Filho (1977, p. 88) destaca que o século XIX foi marcado essencialmente pelo apogeu do Parlamento inglês, onde o modelo de Montesquieu da separação dos poderes foi preponderante. O Parlamento era onde “efetivamente se concentrava o poder emanado do povo. A democracia se confundia com a soberania parlamentar. A vontade do povo era a vontade do Parlamento”. Este apogeu saiu dos limites ingleses e se espalhou pelo mundo, influenciando até nações presidencialistas como os Estados Unidos da América.
A professora Júlia Maurmann Ximenes (2008), em estudo sobre o conteúdo do Estado Democrático de Direito, traz a posição de um dos principais filósofos políticos do liberalismo, John Locke, sobre os direitos naturais inalienáveis do homem, onde o Estado é visto como Estado-Polícia devendo vigiar a aplicação das liberdades e igualdades formais (positivadas). Neste sentido, o filósofo subordinava todos os poderes ao Poder Legislativo e priorizava o princípio da legalidade. Assim não haveria autoridade se esta não estivesse associada ao manto da lei e do Poder Legislativo.
Entretanto, o Parlamento foi da ascensão ao declínio. O Legislativo tornou-se onipotente, passando a negar a própria separação dos poderes e, segundo o autor, não faltou quem se lembrasse das palavras proféticas de Montesquieu: “Se não há qualquer freio para deter os empreendimentos do corpo legislativo, este será despótico; pois, como poderá atribuir-se todo o poder que imaginar, destruirá todos os demais poderes”. Mas o que aconteceu foi justamente o contrário do previsto por Montesquieu. Destaca Ferreira Filho (1977) que o Legislativo, que passou a negar a separação dos poderes, conforme dito acima, declinou devido ao acúmulo de funções, o que paralisou suas atividades.
Aponta, ainda, que a crise do parlamento se deu pela ascensão das massas como força política. Antes o sufrágio era restrito aos que possuíam um mínimo de riqueza, e com o advento do sufrágio universal surge um embate no sistema do Parlamento, cai em declínio o predomínio das ideias burguesas. O autor justifica essa afirmação demonstrando que com um Poder Legislativo cindido entre os parlamentares burgueses e os parlamentares representantes do proletariado, o trabalho parlamentar tornou-se lento. As massas consequentemente tornaram-se maioria pela expressividade inclusive dos votos e suscitaram a intervenção do Estado no domínio econômico e social para a melhoria das condições de vida. Estava assim sendo rompido o liberalismo.  (FERREIRA FILHO, 1977)
No entanto o Legislativo não estava aparelhado o suficiente para a implantação do intervencionismo, faltavam técnicos capazes e somaram-se a isso, as leis como ferramentas pouco adequadas para a direção da economia. Desta forma um Legislativo lento - uma vez que as leis deveriam seguir todo o procedimento de aprovação - e incapaz de atender os anseios imediatos da sociedade que representavam, foram as principais características que fizeram com que o Parlamento perdesse prestígio. O Legislativo se viu estagnado diante do crescimento do Estado e principalmente dos problemas que chegavam junto com o desenvolvimento. [2]
Diante da falta de flexibilidade da atuação legislativa foi inevitável a ascensão de outro poder para atender as pretensões populares. Ocupou importante espaço o Poder Executivo no comando do domínio econômico e social diante da crise do Parlamento. Como o chefe do Executivo representa a maioria parlamentar de um partido, foi natural a subordinação do Legislativo, e aquele passou a sujeitar este a sua vontade.
Tornou-se então o Executivo ‘o centro do poder real nos Estados modernos’ na observação de Duverger. Em seu benefício, é o Legislativo desapossado de inúmeras funções, a própria elaboração das leis lhe escapa das mãos, cada vez mais freqüentes os decretos-leis por que o Executivo efetivamente legisla. [...] (FERREIRA FILHO, 1977, p.92)
Mas segundo o pensamento de Ferreira Filho (1977), a supremacia do Executivo no mundo contemporâneo não é imutável, assim como a existência do Legislativo atuante e forte não é dispensável.

2.2 O exame do papel do Poder Legislativo no Estado contemporâneo.

Segundo Ferreira Filho (1977), a divisão dos poderes consagrava apenas a liberdade dos cidadãos e não a prosperidade e bem-estar como finalidade do Estado. Cada poder apenas exerceria as funções que lhe são inerentes. Mas o Estado contemporâneo não permite este pensamento simplista, deve assegurar a felicidade e prosperidade geral.
Entre as exigências do desenvolvimento está o crescimento econômico do Estado, que repercute na seguinte observação de Ferreira Filho (1977, p. 95):
O processo de modernização excita necessariamente reivindicações e inconformismos, gera expectativas e ambição que não podem ter satisfação pronta. Contra elas exatamente pesa a necessidade de investimentos imensos, indispensáveis para a sustentação ou aceleração do desenvolvimento, investimentos esses que presumem acumulação de capital. Ora, esta acumulação repercute em restrição do consumo, força redistribuição da riqueza, numa palavra, gera insatisfação.
Neste contexto emerge a importância da atuação do Poder Executivo para o desenvolvimento do Estado, assevera o autor que este possui a função da promoção do bem-estar através de decisões prontas, firmes e flexíveis que reclamam a direção da economia. A agilidade do Executivo para atender aos reclamos do desenvolvimento acelerado ganha notoriedade, tendo em vista que o Legislativo não pode atender a problemas tão imediatos. A elaboração de leis reclama maior cautela, principalmente quando se trata da direção econômica do Estado, assim estabelece vantagem a flexibilidade Poder Executivo.
[...] Somente ele pode pilotar as forças produtivas no dia-a-dia, conduzindo-as para o atendimento do interesse geral por entre os problemas e dificuldades que a cada momento se levantam.
[...]
Por outro lado como nas democracias atuais, estruturadas em partidos, nele se concentra a cúpula destes, forçoso é aceitar que a ele se atribua a orientação geral do Governo, o planejamento de sua ação. Com efeito, se se aceita que o povo há de fixar os objetivos, optando por um programa de governo estabelecido por um partido, não cabe recusar que esse programa seja transformado em plano de governo pela direção do partido majoritário. Ora, em qualquer dos regimes políticos da atualidade, o núcleo dirigente do partido ou coligação majoritária constitui o Executivo. (FERREIRA FILHO, 1977, p. 95-96).
Todavia é necessário ressaltar que o Executivo pode ser a mola mestra do Estado, mas tal impulso não pode ser realizado sem a participação do Legislativo. O Parlamento, segundo Ferreira Filho (1977, p. 97) é onde estão os representantes do povo incumbidos de uma dupla missão: “transmitir a opinião dos governados sobre os problemas em debate, tomar a decisão mais condizente com o interesse geral e com a Justiça, ouvidas e ponderadas as razões de todos”.
O autor também destaca a importância do debate parlamentar uma vez que o Legislativo deve contribuir para o discussões entre o plano de governo e as proposições que o implementam. É o povo, mediante seus representantes, influenciando nas decisões e políticas de governo.
[...] o debate parlamentar é um dos meios pelos quais se difunde entre o povo a informação sobre os grandes problemas políticos. [...] Assume este, destarte, um inegável caráter educativo, pois no contraste dos argumentos, no confronto dos aplausos e da crítica, ganha o cidadão conhecimento matizado e lapidado do por que e do para que das medidas governamentais, dos mais variados aspectos de todos os problemas que a Nação há de enfrentar. (FERREIRA FILHO, 1977, p. 97)
O Poder Legislativo, de acordo com o doutrinador, é o poder mais fácil de verificar a fidelidade e respeito à opção popular, dos atos e omissões que podem prejudicar o interesse comum perpetrados pelo Poder Executivo. Aqui está o papel do parlamento no controle e oposição ao governo estabelecido contribuindo para o bom andamento dos negócios públicos. Portanto, o Legislativo contribui para o debate e controle da política governamental, mas sem deixar sua missão precípua: a elaboração das leis. Segundo Ferreira Filho (1977), esta é a “tarefa mais nobre” do Parlamento.
Ao tratar do poder financeiro do parlamento, o autor, afirma que este se encontra na criação de tributos e na fixação do orçamento e tais competências não podem ser deixadas ao bel prazer do Executivo. O Legislativo é quem deve criar e fiscalizar a aplicação dos tributos e dos recursos orçamentários principalmente na República onde os representantes são temporários e não donos do poder. A fiscalização deve ser realizada em razão dos vultosos recursos manipulados pelo Estado e seus múltiplos empreendimentos, o que também faz com se multipliquem as possibilidades de mau uso dessas somas.
Para o doutrinador, a autenticidade da representação do povo pelos parlamentares depende de dois fatores: o sistema eleitoral e a estrutura partidária. O primeiro não pode afastar o eleitor do eleito; o contrato entre eles deve ser permanente. Destaque merece a opinião do autor sobre o sufrágio distrital, para quem o corpo eleitoral circunscrito e determinado ouve com mais atenção as críticas e solicitações. Pelo segundo fator – a estrutura partidária – os partidos não podem ser oligárquicos. Para o bom andamento do Estado é necessária tanto a representação do interesse geral e como a representação dos interesses particulares, mas no Parlamento todos devem falar em nome do bem comum mesmo quando tratarem de interesse que provenham de lobbies. Segundo o autor, é melhor ter estas representações particulares às claras do que a atuação clandestina e incontrolada deste segmento no âmbito do Poder Legislativo.
Destaca, ainda, que a assessoria no Legislativo exerce função fundamental para que este desempenhe bem sua missão. É necessária uma organização complexa e de alto nível, composta por especialistas que conheçam os problemas nacionais.
 
2.3 A importância do Legislativo: conclusões do autor.

Ao finalizar a análise, Ferreira Filho (1977) destaca em sua obra a importância do Legislativo em todas as fases de luta pela afirmação da identidade nacional, em cada bandeira levantada e que faltamente sempre resultaram em intervenções e modificações políticas.
Guardião da liberdade, voz da Democracia, ainda é o Legislativo. É defensor da liberdade, mas esta não é criada por ele. A liberdade se enraíza na consciência dos homens. Surge irresistível, quando, tendo presente que é responsável pelo próprio destino, o povo quer ser livre. Assume o encargo de ser livre. (FERREIRA FILHO, 1977, p. 103)
Enfatiza a importância da participação popular na condução dos governos, no rumo da democracia: “[...] Não são as instituições sozinhas que fazem a Democracia, esta provém da consciência dos homens.” (FERREIRA FILHO, 1977, p. 104)
Ressalta ao final as palavras do Padre Antônio Vieira, na obra Sermões (1951):
Dizia Vieira que não ‘há mando mais mal sofrido nem mais mal obedecido que o dos iguais’. Aí está, numa formula concisa, resumida a dificuldade inerente ao governo democrático. Fora da Democracia, porém, não há governo compatível com a liberdade humana. Sem Parlamento, respeitado e livre, ensina a História, não pode haver nem liberdade, nem democracia! (Ferreira Filho, 1977, p. 104)
  
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dois capítulos acima analisados, extraídos da obra deste renomado doutrinador do Direito Constitucional brasileiro, trazem uma visão clara da importância do Poder Legislativo na manutenção do Estado Democrático nacional. Desde suas raízes históricas até as discussões sobre a democracia representativa, em especial sobre a viabilidade dos modelos sobre os partidos políticos, é possível verificar que diante de toda a evolução social, ainda não há meio que se sobreponha a estruturação do Estado democrático.
A idéia de Rousseau onde um Estado verdadeiramente democrático só existe para um governo de deuses e não de homens não é de toda questionável. Os homens são falíveis e sofrem influências de toda ordem, inclusive do progresso que tem experimentado de maneira cada vez mais acelerada nos últimos anos. Sendo um ser individualista por natureza[3], o homem frequentemente é confrontado por suas posições morais e éticas em conflito com os interesses coletivos. Entretanto, ainda não se concebeu um modelo de governo sem vícios, e fatalmente ele não existirá. Afinal os erros são inevitáveis em um governo feito por homens.
As críticas feitas ao modelo da democracia pelos partidos conforme adotado pelo constitucionalismo brasileiro não se perderam no tempo, ao contrário, perpetuam-se acentuadamente nos últimos anos. A obra publicada em 1977 encontra vasta contemporaneidade com publicações da imprensa atual. Para ilustrar, a reportagem publicada pela Revista Veja, em 09 de março de 2011, critica veementemente a falta de ideologias dos partidos políticos atuais, que estão mais interessados na grande fatia do “bolo” chamado tributos que despencam nos caixas da União. A base de aliados do governo se expande, pois todos estão interessados em conseguir mais recursos financeiros do governo federal para os Estados e Municípios que comandam, e assim uma das principais funções do Legislativo que é a fiscalização do Executivo torna-se inexistente e o que deveria ser negociação acaba tornando-se cooptação.[4]
Estes e outros problemas que assolam a democracia brasileira e de outras nações é que levam ao descrédito nos poderes Legislativo e Executivo nacionais, tornando aqueles que deveriam representar o povo e cuidar do bem-estar da coletividade em meros detentores de poder sem confiabilidade, comprometendo inclusive aqueles que de alguma forma ainda tentam moralizar a política nacional e adequá-la aos anseios de uma sociedade comprometida com o desenvolvimento equilibrado e próspero, atuando com ética e responsabilidade em suas ações.
Nesta ótica o atual século XXI presencia o declínio dos poderes Legislativo e Executivo, motivado sobretudo pela falta de pró-atividade diante dos problemas gerados pelo acelerado desenvolvimento. O espaço deixado pela falta de atuação esta sendo paulatinamente ocupado pelo Judiciário, fenômeno que muitos estudiosos vêm intitulando de “judicialização da política”, que por extensão e complexidade merece estudo especial que não cabem nestas simples considerações. O alerta serve apenas para que sejam repensadas as bases em que foram construídos os pilares da democracia, primando pela separação dos poderes e, principalmente, pelo sistema de freios e contrapesos que cada um deles deve exercer para a manutenção real da democracia.
O momento é de repensar os rumos da democracia atual e da função dos poderes que compõem o Estado nacional. O futuro é incerto e não existe nada imutável, sendo a própria evolução da democracia resultado destas transformações. Mas o que não pode ser deixado de lado são os erros do passado para evitar a estagnação no presente. Se o povo perde representatividade e permanece passivo estará fadado a conviver com o sistema ditatorial que virá à tona mais cedo ou mais tarde, seja ele de qualquer índole. É preciso evitar tal retrocesso através do fortalecimento do Poder Legislativo com pessoas e partidos políticos comprometidos realmente com o Estado-nação e não com a defesa de interesses individualistas e ilegítimos no Parlamento.
 
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Constituição (1988). Vade Mecum Compacto. Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes. 3. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010.
FERREIRA FILHO, Manuel Gonçalves. Sete vezes democracia. São Paulo: Convívio, 1977.
NOLETO, Mauro Almeida. Justiça e Democracia: notas sobre a participação da Justiça Eleitoral na construção da democracia política brasileira. IESB. 2008. Disponível em: < http://www.iesb.br/ModuloOnline/Atena/arquivos_upload/Noleto.pdf >. Data da pesquisa: 06.jun.2011.
PORTELA, Fábio. Mamãe, eu quero mamar. In: Revista Veja: “Ei, você aí, me dá um partido aí...”. Ed. 2207. Ano 44. n. 10. 09 mar. 2011. p. 40-47.
TAVEIRA, Adriana do Val Alves. Democracia e Cidadania no Contexto Atual. UFG. R. Fac. Dir. UFG, V. 33, n. 1, p. 129-138, jan. / jun. 2009. Disponível em: <www.revistas.ufg.br/index.php/revfd/article/download/9805/6696>. Data da pesquisa: 06.jun.2011.
XIMENEZ, Júlia Maurmann. Reflexões sobre o conteúdo do Estado Democrático de Direito. IESB. 2008. Disponível em: <http://www.iesb.br/ModuloOnline/Atena/arquivos_upload/Julia%20Maurmann%20Ximenes.pdf >. Data da pesquisa: 06. jun.2011.
 Notas:

 [1] A Constituição Federal de 1988 não trouxe por acaso como primeiro capítulo do Título IV, que trata da Organização dos Poderes, as disposições sobre o Poder Legislativo, afinal a Constituição cidadã que estabelece no preâmbulo a instituição de um “Estado Democrático destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social [...]”, possui no Poder Legislativo o principal responsável pela efetivação de todos estes pilares, desde que ele esteja ativo e atento para os interesses da coletividade. Somente com um Poder Legislativo atuante e comprometido com os anseios sociais e os pilares constitucionais será possível a consagração efetiva do ideal democrático da atual República Federativa do Brasil. Temos na Constituição Federal de 1988 a preponderância do modelo de Montesquieu, assim como aconteceu na Inglaterra do século XIX.
[2] Adriana do Val Alves Taveira, em estudo publicado em 2009 pela Universidade Federal de Goiás, afirma que a democracia moderna foi fundada no Estado Liberal mais não ficou restrita a este. A doutrina do Estado de bem-estar social, aplicada inicialmente na República Alemã de Weimar em 1919 e formulada teoricamente por economistas como John Maynard Keynes que na obra Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda” estabeleceu as proposições do Estado intervencionista com a busca de direitos sociais que deveriam ser assegurados não como caridade, mas como direitos inerentes à cidadania. Pela teoria do Estado intervencionista a estabilidade econômica e social é alcançada através de medidas socializantes, com um Estado Social Democrático sistematizando direitos econômicos e sociais do homem que jamais foram idealizados pelo Estado Liberal. (TAVEIRA, 2009, p. 06)

[3] Individualismo este ressaltado pelo próprio autor citando inclusive as palavras de Frei Vicente de Salvador e de Oliveira Viana.
[4] Neste sentido, o jornalista Fábio Portela em reportagem veiculada pela revista Veja, empreende estudo sobre a falta do caráter ideológico nos partidos políticos e do jogo de interesses que existe entre os políticos nacionais que trocam de legenda com a mesma naturalidade de quem troca de “fantasia sem medo do ridículo”. O jornalista faz importantes observações, entre elas, uma que também é atestada pelo autor Manoel Gonçalves Ferreira Filho no decorrer de sua obra: “Ao contrário do que ocorreu na Europa, onde os partidos surgiram com os Estados modernos e se organizaram em torno de grandes doutrinas ideológicas, as siglas, no Brasil, sempre responderam a líderes, raramente a ideias. [...] as matrizes da política brasileira foram criadas por conveniência, e não guiadas por um ideário. [...] Partidos de mais para ideias de menos, como se pode concluir pela análise dos programas da maioria das siglas”. (Revista Veja, Edição 2207, ano 44, n° 10, 09/03/2011, p. 41-47).

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Giselle Borges Alves, advogada em Unaí/MG, Bacharel em Direito pelo Instituto de Ensino Superior Cenecista - INESC/CNEC; pósgraduanda em Direito Processual Civil pela Rede de Ensino Luís Flávio Gomes em parceria com a Universidade Anhanguera Uniderp e o Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP).

Sobre o texto:
Resenha elaborada apartir da relatoria dos capítulos III e IV da obra "Sete Vezes Democracia" do autor Manoel Gonçalves Ferreira Filho, na reunião do Grupo de Pesquisa em Direito Público - Professora Juliana Guedes, sob coordenação da Prof. Ms. Ivete Maria de Oliveira Alves, realizada em 10 de março de 2011.

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