Jurisprudência selecionada.
DIREITO CIVIL
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE
CIVIL POR DANOS DECORRENTES DE ABUSO DO DIREITO DE AÇÃO EXECUTIVA.
O
advogado que ajuizou ação de execução de honorários de sucumbência não só
contra a sociedade limitada que exclusivamente constava como sucumbente no
título judicial, mas também, sem qualquer justificativa, contra seus sócios
dirigentes, os quais tiveram valores de sua conta bancária bloqueados sem
aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, deve aos
sócios indenização pelos danos materiais e morais que sofreram. Com efeito, a lei não faculta
ao exequente escolher quem se sujeitará à ação executiva, independentemente de
quem seja o devedor vinculado ao título executivo. Ressalte-se que, tendo as
sociedades de responsabilidade limitada vida própria, não se confundem com as
pessoas dos sócios. No caso de as cotas de cada um estarem totalmente
integralizadas, o patrimônio pessoal dos sócios não responde por dívidas da
sociedade. Portanto, a regra legal a observar é a do princípio da autonomia da
pessoa coletiva, distinta da pessoa de seus sócios ou componentes, distinção
que só se afasta provisoriamente e tão só em hipóteses pontuais e concretas. É
certo que existem exceções, e a disregard doctrine é um meio de estender aos sócios da
empresa a responsabilidade patrimonial por dívidas da sociedade. Não menos
certo, porém, é que a desconsideração da personalidade jurídica depende da
constatação de que ela esteja servindo como cobertura para abuso de direito ou
fraude nos negócios e atos jurídicos, hipótese em que o juiz pode, em decisão
fundamentada, ignorar a personalidade jurídica e projetar os efeitos dos atos
contra a pessoa física que dela se beneficiou (art. 50 do CC). Além disso, o
ato ilícito é um gênero dos quais são espécies as disposições insertas nos
arts. 186 (violação do direito alheio) e 187 (abuso de direito próprio) do CC.
Ambas as espécies se identificam por uma consequência comum, indicada no art.
927, ou seja, a reparação. Havendo excesso quanto ao limite imposto pelo fim
econômico ou social do direito exercido, pela boa-fé ou pelos bons costumes,
está caracterizado o abuso de direito. Nas hipóteses específicas de execução, o
CPC traz regra segundo a qual "o credor ressarcirá ao devedor os danos que
este sofreu, quando a sentença, passada em julgado, declarar inexistente, no
todo ou em parte, a obrigação, que deu lugar à execução" (art. 574). Esse
dispositivo, de natureza idêntica ao art. 187 do CC, pois ambos visam ao
ressarcimento na hipótese de danos decorrentes de abuso de direito, é utilizado
em casos de emprego abusivo da ação executiva, por exemplo, quando se propõe
execução cujo título não garanta a efetiva existência de crédito, mesmo que
isso venha a ser reconhecido após o ajuizamento da demanda, ou quando há
direcionamento da execução contra quem não é responsável pelo crédito. No que
diz respeito aos danos morais, o fato, por si só, de os sócios dirigentes da
sociedade empresária comporem o polo passivo de uma ação não enseja a
responsabilização, pois os ônus que os sócios sofreram em nome próprio
sofreriam se tivessem atuando gerencialmente em nome da sociedade devedora.
Contudo, desnecessariamente viram parte de seu patrimônio constrita, e isso em
razão da astúcia do credor, pois, sendo técnico em direito, já que é advogado,
não é razoável concluir que não soubesse que agia ferindo a lei. A ninguém é
dado buscar facilidades em detrimento da lei ou de quem quer que seja, pois o
limite de atuação está na lei. Quando há abuso, há prejuízos. Assim, há nexo
causal entre o ato abusivo praticado pelo credor e os danos causados aos sócios
pelos aborrecimentos que atingiram a esfera pessoal de cada um. REsp 1.245.712-MT, Rel. Min. João Otávio de
Noronha, julgado em 11/3/2014.
DIREITO CIVIL. TERMO INICIAL
DOS JUROS DE MORA RELATIVOS À EXECUÇÃO DESAUTORIZADA DE OBRA MUSICAL.
Contam-se
da execução pública não autorizada de obra musical – e não da data da citação –
os juros de mora devidos em razão do não recolhimento de direitos ao Escritório
Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD). O ECAD – órgão instituído e
administrado pelas associações de gestão coletiva musical, mandatárias de todos
os titulares de obras musicais a elas filiados – intermedeia, em nome dos
autores de composições musicais, a arrecadação, distribuição e fiscalização dos
seus direitos. Assim, deve-se determinar não a natureza da relação entre os executores
de composições musicais e o ECAD, e sim a natureza da relação entre esses
executores e os próprios autores, que são apenas representados pelo ECAD na
arrecadação e fiscalização de seus direitos. Nesse aspecto, ganha relevância o
comando do art. 68 da Lei 9.610/1998, segundo o qual, sem prévia e expressa
autorização do titular, não poderão ser utilizadas composições musicais em
representações e execuções públicas. Necessário distinguir ainda a relação
decorrente da execução desautorizada de composição musical, daquela derivada da
execução realizada mediante prévia autorização do titular. Evidentemente, na
execução comercial desautorizada de obra musical, a relação entre o titular da
obra e o executor será extracontratual, ante a inexistência de vínculo entre as
partes. Todavia, a situação muda de figura quando a execução comercial de
composições musicais advém de prévia autorização do titular, ainda que por
intermédio do ECAD, em que há autêntico acordo de vontades para a cessão
parcial, temporária e não exclusiva de direitos autorais. Em suma, na execução
comercial desautorizada de obras musicais a relação entre executor e ECAD
(mandatário dos titulares das obras) é extracontratual, de sorte que eventual
condenação judicial fica sujeita a juros de mora contados desde o ato ilícito,
nos termos do art. 398 do CC e da Súmula 54 do STJ. E na execução comercial
autorizada a relação entre executor e ECAD é contratual, de maneira que sobre
eventual condenação judicial incidem juros de mora contados desde a citação,
nos termos do art. 405 do CC. REsp 1.424.044-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 25/3/2014.
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. LEGITIMIDADE PARA PLEITEAR DECLARAÇÃO DE NULIDADE EM DOAÇÃO INOFICIOSA.
O
herdeiro que cede seus direitos hereditários possui legitimidade para pleitear
a declaração de nulidade de doação inoficiosa (arts. 1.176 do CC/1916 e 549 do
CC/2002) realizada pelo autor da herança em benefício de terceiros. Isso porque o fato de o
herdeiro ter realizado a cessão de seus direitos hereditários não lhe retira a
qualidade de herdeiro, que é personalíssima. De fato, a cessão de direitos
hereditários apenas transfere ao cessionário a titularidade da situação jurídica
do cedente, de modo a permitir que aquele exija a partilha dos bens que compõem
a herança. REsp 1.361.983-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 18/3/2014.
DIREITO CIVIL. JUROS
REMUNERATÓRIOS NÃO PREVISTOS NO CONTRATO DE MÚTUO FIRMADO ENTRE A COOPERATIVA
DE CRÉDITO E O COOPERADO.
A
cooperativa de crédito pode exigir de seu cooperado juros remuneratórios em
percentual não superior à taxa média de mercado, quando o percentual do encargo
tiver sido estipulado pelo conselho de administração da cooperativa, conforme
previsão estatutária, e tenha ocorrido a ampla divulgação da referida taxa,
mesmo que o contrato de mútuo seja silente em relação ao percentual dos juros remuneratórios. Com efeito, decorre do art. 21, caput, da Lei 5.764/1971 que a
filiação à cooperativa implica adesão automática e implícita às normas do
estatuto social, mantendo a higidez das relações entre os cooperados e entre
esses e a cooperativa. Nessa linha, o STJ assevera que os estatutos das cooperativas
contêm as normas fundamentais sobre a organização, a atividade de seus órgãos e
os direitos e deveres dos associados. Ressalte-se, ainda, que as cooperativas
de crédito não perseguem o lucro, havendo rateio de sobras e perdas, conforme
previsão no estatuto social, levando em conta a proporcionalidade da expressão
econômica das operações dos associados. Nesse contexto, sobressaem as
atividades com encargos e tarifas menores às oferecidas pelo mercado,
destacando-se que a cobrança de juros é uma das formas pela qual a entidade
arrecada contribuições de seus associados e pela qual lhes propicia vantagem
comparativa em relação às demais instituições financeiras. Além disso, as
cooperativas de crédito são instituições financeiras, razão pela qual não há
submissão dessas à Lei de Usura. Desse modo, a estipulação dos juros
remuneratórios pelo conselho de administração da cooperativa, consoante
previsão estatutária, permite a cobrança do encargo ali definido, ainda que
esse não conste no contrato de mútuo, desde que o percentual exigido não supere
a taxa média estabelecida pelo mercado. REsp 1.141.219-MG, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 3/4/2014.
DIREITO CIVIL. DEDUÇÃO DO DPVAT
DO VALOR DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
O valor
correspondente à indenização do seguro de danos pessoais causados por veículos automotores
de via terrestre (DPVAT) pode ser deduzido do valor da indenização por danos
exclusivamente morais fixada judicialmente, quando os danos psicológicos
derivem de morte ou invalidez permanente causados pelo acidente. De acordo com o art. 3º da Lei
6.194/1974, com a redação dada pela Lei 11.945/2009, os danos pessoais cobertos
pelo seguro obrigatório compreendem “as indenizações por morte, por invalidez
permanente, total ou parcial, e por despesas de assistência médica e
suplementares”. Embora o dispositivo especifique quais os danos passíveis de
indenização, não faz nenhuma ressalva quanto aos prejuízos morais derivados
desses eventos. A partir de uma interpretação analógica de precedentes do STJ,
é possível concluir que a expressão “danos pessoais” contida no referido artigo
abrange todas as modalidades de dano – materiais, morais e estéticos –,
desde que derivados dos eventos expressamente enumerados: morte, invalidez
permanente e despesas de assistência médica e suplementares. Nesse aspecto, “a apólice
de seguro contra danos corporais pode excluir da cobertura tanto o dano moral
quanto o dano estético, desde que o faça de maneira expressa e individualizada
para cada uma dessas modalidades de dano extrapatrimonial” (REsp 1.408.908-SP,
Terceira Turma, DJe de 19/12/2013). De forma semelhante, o STJ também já
decidiu que “a previsão contratual de cobertura dos danos corporais abrange os
danos morais nos contratos de seguro” (AgRg no AREsp 360.772-SC, Quarta Turma,
DJe de 10/9/2013). Acrescente-se que o fato de os incisos e parágrafos do art.
3º da Lei 6.194/1974 já fixarem objetivamente os valores a serem pagos conforme
o tipo e o grau de dano pessoal sofrido não permite inferir que se esteja
excluindo dessas indenizações o dano moral; ao contrário, conclui-se que nesses
montantes já está compreendido um percentual para o ressarcimento do abalo
psicológico, quando aplicável, como é o caso da invalidez permanente que,
indubitavelmente, acarreta à vítima não apenas danos materiais (decorrentes da
redução da capacidade laboral, por exemplo), mas também morais (derivados da
angústia, dor e sofrimento a que se submete aquele que perde, ainda que
parcialmente, a funcionalidade do seu corpo). REsp 1.365.540-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 23/4/2014.
DIREITO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE
DE PURGAÇÃO DA MORA EM CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA FIRMADOS APÓS A
VIGÊNCIA DA LEI 10.931/2004. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES.
8/2008-STJ).
Nos
contratos firmados na vigência da Lei 10.931/2004, que alterou o art. 3º, §§ 1º
e 2º, do Decreto-lei 911/1969, compete
ao devedor, no prazo de cinco dias após a execução da liminar na ação de busca
e apreensão, pagar a integralidade da dívida – entendida esta como os valores
apresentados e comprovados pelo credor na inicial –, sob pena de consolidação
da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. De início, convém esclarecer
que a Súmula 284 do STJ, anterior à Lei 10.931/2004, orienta que a purgação da
mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos
pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado. A referida súmula
espelha a redação primitiva do § 1º do art. 3º do Decreto-lei 911/1969, que
tinha a seguinte redação: “Despachada a inicial e executada a liminar, o réu será
citado para, em três dias, apresentar contestação ou, se já houver pago 40%
(quarenta por cento) do preço financiado, requerer a purgação de mora.”
Contudo, do cotejo entre a redação originária e a atual – conferida pela Lei
10.931/2004 –, fica límpido que a lei não faculta mais ao devedor a purgação da
mora, expressão inclusive suprimida das disposições atuais, não se extraindo do
texto legal a interpretação de que é possível o pagamento apenas da dívida
vencida. Ademais, a redação vigente do art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei
911/1969 estabelece que o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da
dívida pendente e, se assim o fizer, o bem lhe será restituído livre de ônus,
não havendo, portanto, dúvida acerca de se tratar de pagamento de toda a dívida,
isto é, de extinção da obrigação. Vale a pena ressaltar que é o legislador quem
está devidamente aparelhado para apreciar as limitações necessárias à autonomia
privada em face de outros valores e direitos constitucionais. A propósito, a
normatização do direito privado desenvolveu-se de forma autônoma em relação à
Constituição, tanto em perspectiva histórica quanto em conteúdo, haja vista que
o direito privado, em regra, disponibiliza soluções muito mais diferenciadas
para conflitos entre os seus sujeitos do que a Constituição poderia fazer. Por
isso não se pode presumir a imprevidência do legislador que, sopesando as
implicações sociais, jurídicas e econômicas da modificação do ordenamento
jurídico, vedou para alienação fiduciária de bem móvel a purgação da mora,
sendo, pois, a matéria insuscetível de controle jurisdicional
infraconstitucional. Portanto, sob pena de se gerar insegurança jurídica e
violar o princípio da tripartição dos poderes, não cabe ao Poder Judiciário, a
pretexto de interpretar a Lei 10.931/2004, criar hipótese de purgação da mora
não contemplada pela lei. Com efeito, é regra basilar de hermenêutica a
prevalência da regra excepcional, quando há confronto entre as regras
específicas e as demais do ordenamento jurídico. Assim, como o CDC não regula
contratos específicos, em casos de incompatibilidade entre a norma consumerista
e a aludida norma específica, deve prevalecer essa última, pois a lei especial
traz novo regramento a par dos já existentes. Nessa direção, é evidente que as
disposições previstas no CC e no CDC são aplicáveis à relação contratual
envolvendo alienação fiduciária de bem móvel, quando houver compatibilidade
entre elas. Saliente-se ainda que a alteração operada pela Lei 10.931/2004 não
alcança os contratos de alienação fiduciária firmados anteriormente à sua
vigência. De mais a mais, o STJ, em diversos precedentes, já afirmou que, após
o advento da Lei 10.931/2004, que deu nova redação ao art. 3º do Decreto-lei
911/1969, não há falar em purgação da mora, haja vista que, sob a nova
sistemática, após o decurso do prazo de 5 (cinco) dias contados da execução da
liminar, a propriedade do bem fica consolidada em favor do credor fiduciário,
devendo o devedor efetuar o pagamento da integralidade do débito remanescente a
fim de obter a restituição do bem livre de ônus. Precedentes citados: AgRg no
REsp 1.398.434-MG, Quarta Turma, DJe 11/2/2014; e AgRg no REsp 1.151.061-MS,
Terceira Turma, DJe 12/4/2013. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 14/5/2014.
DIREITO CIVIL. PENA
CONVENCIONAL E INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS.
Não se
pode cumular multa compensatória prevista em cláusula penal com indenização por
perdas e danos decorrentes do inadimplemento da obrigação. Enquanto a cláusula penal
moratória manifesta com mais evidência a característica de reforço do vínculo
obrigacional, a cláusula penal compensatória prevê indenização que serve não
apenas como punição pelo inadimplemento, mas também como prefixação de perdas e
danos. A finalidade da cláusula penal compensatória é recompor a parte pelos
prejuízos que eventualmente decorram do inadimplemento total ou parcial da
obrigação. Tanto assim que, eventualmente, sua execução poderá até mesmo
substituir a execução do próprio contrato. Não é possível, pois, cumular
cláusula penal compensatória com perdas e danos decorrentes de inadimplemento
contratual. Com efeito, se as próprias partes já acordaram previamente o valor
que entendem suficiente para recompor os prejuízos experimentados em caso de
inadimplemento, não se pode admitir que, além desse valor, ainda seja acrescido
outro, com fundamento na mesma justificativa – a recomposição de prejuízos.
Ademais, nessas situações sobressaem direitos e interesses eminentemente disponíveis,
de modo a não ter cabimento, em princípio, a majoração oblíqua da indenização
prefixada pela condenação cumulativa em perdas e danos. REsp 1.335.617-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti,
julgado em 27/3/2014.
DIREITO CIVIL. INOPONIBILIDADE
DO DIREITO REAL DE HABITAÇÃO NO CASO DE COPROPRIEDADE ANTERIOR À ABERTURA DA
SUCESSÃO.
A viúva
não pode opor o direito real de habitação aos irmãos de seu falecido cônjuge na
hipótese em que eles forem, desde antes da abertura da sucessão,
coproprietários do imóvel em que ela residia com o marido. De fato, o direito real de
habitação (arts. 1.611, § 2º, do CC/1916 e 1.831 do CC/2002) tem como essência
a proteção do direito de moradia do cônjuge supérstite, dando aplicação ao princípio
da solidariedade familiar. Nesse contexto, de um lado, vislumbrou-se que os
filhos devem, em nome da solidariedade familiar, garantir ao seu ascendente a
manutenção do lar; de outro lado, extraiu-se da ordem natural da vida que os
filhos provavelmente sobreviverão ao habitador, momento em que poderão exercer,
na sua plenitude, os poderes inerentes à propriedade que detêm. Ocorre que, no
caso em que o cônjuge sobrevivente residia em imóvel de copropriedade do
cônjuge falecido com os irmãos, adquirida muito antes do óbito, deixa de ter
razoabilidade toda a matriz sociológica e constitucional que justifica a
concessão do direito real de habitação ao cônjuge sobrevivente, pois não há
elos de solidariedade entre um cônjuge e os parentes do outro, com quem tem
apenas vínculo de afinidade, que se extingue, à exceção da linha reta, quando
da dissolução do casamento. Além do mais, do contrário, estar-se-ia admitindo o
direito real de habitação sobre imóvel de terceiros, em especial porque o
condomínio formado pelos familiares do falecido preexiste à abertura da
sucessão. Precedente citado: REsp 1.212.121-RJ, Quarta Turma, DJe 18/12/2013. REsp 1.184.492-SE, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 1º/4/2014.
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE DA QUITAÇÃO DADA EM ESCRITURA PÚBLICA.
A
quitação dada em escritura pública gera presunção relativa do pagamento,
admitindo prova em contrário que evidencie a invalidade do instrumento eivado
de vício que o torne falso. Com
efeito, nos termos do art. 215 do CC, a escritura lavrada em cartório tem fé
pública, o que significa dizer que é documento dotado de presunção de veracidade.
O que ocorre com a presunção legal do referido dispositivo é a desnecessidade
de se provar os fatos contidos na escritura (à luz do que dispõe o art. 334,
IV, do CPC) e também a inversão do ônus da prova, em desfavor de quem,
eventualmente, suscite a sua invalidade. Outro não é o motivo pelo qual os
arts. 214 e 216 da Lei 6.015/1976 (Lei de Registros Públicos) assim preveem:
“As nulidades de pleno direito do registro, uma vez provadas, invalidam-no,
independentemente de ação direta” e “O registro poderá também ser retificado ou
anulado por sentença em processo contencioso, ou por efeito do julgado em ação
de anulação ou de declaração de nulidade de ato jurídico, ou de julgado sobre
fraude à execução”. Portanto, a quitação dada em escritura pública não é uma
“verdade indisputável”, na medida em que admite a prova de que o pagamento não
foi efetivamente realizado, evidenciando, ao fim, a invalidade do instrumento
em si, porque eivado de vício que o torna falso. Assim, entende-se que a
quitação dada em escritura pública presume o pagamento, até que se prove o
contrário. REsp 1.438.432-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 22/4/2014.
DIREITO EMPRESARIAL
DIREITO EMPRESARIAL E
PROCESSUAL CIVIL. JUÍZO UNIVERSAL DA FALÊNCIA.
O
reconhecimento, por sentença transitada em julgado, de que elidiu a falência o
depósito do valor principal do título executivo extrajudicial cujo
inadimplemento baseou o pedido de quebra (art. 1º, § 3º, Decreto-Lei
7.661/1995) não torna prevento o juízo para um segundo pedido de falência
fundado na execução frustrada (art. 2º, I, do Decreto-Lei 7.661/1945) do título
executivo advindo daquela sentença quanto aos juros e a correção monetária. O juízo da falência é
indivisível porque competente para todas as ações sobre bens e interesses da
massa falida, conforme enfatizava o art. 7º, § 2º, da antiga Lei Falimentar
(Decreto-Lei 7.661/45), norma repetida no art. 76 da atual Lei de Recuperação
de Empresas (Lei 11.101/2005). O objetivo da vis atractiva do juízo falimentar é submeter a
universalidade dos bens do devedor comum a um regime único, evitando que
apareçam duas ou mais falências paralelas em juízos diferentes, para que, assim,
haja paridade no tratamento dos créditos. É necessário, portanto, que, para se
instaurar o juízo universal da falência, seja efetivamente decretada a falência
pelo juízo competente. Na hipótese em análise, houve reconhecimento do depósito
elisivo do primitivo pedido de quebra, por sentença transitada em julgado,
desaparecendo a possibilidade de decretação da falência com fundamento no
título de crédito, não se tendo, por isso, instaurado o juízo universal da
falência. Efetivamente, o fato de existir uma execução frustrada, advinda de um
título judicial nascido de uma ação falimentar extinta pelo depósito elisivo
parcial, não tem o condão de determinar a distribuição, por prevenção, de um
segundo pedido de falência, pelo fato de que não mais existe a possibilidade de
ocorrerem falências em juízos diferentes. REsp 702.417-SP, Rel. Min. Raul Araújo,
julgado em 11/3/2014.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E
EMPRESARIAL. CLASSIFICAÇÃO DE CRÉDITO REFERENTE A HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO
PROCESSO DE FALÊNCIA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. N.
8/2008-STJ).
Os
créditos resultantes de honorários advocatícios, sucumbenciais ou contratuais,
têm natureza alimentar e equiparam-se aos trabalhistas para efeito de
habilitação em falência, seja pela regência do Decreto-lei 7.661/1945, seja
pela forma prevista na Lei 11.101/2005, observado o limite de valor previsto no
art. 83, I, do referido diploma legal. A questão deve ser entendida a
partir da interpretação do art. 24 da Lei 8.906/1994 (EOAB), combinado com o
art. 102 do Decreto-lei 7.661/1945, dispositivo este cuja regra foi
essencialmente mantida pelo art. 83 da Lei 11.101/2005 no que concerne à
posição dos créditos trabalhistas e daqueles com privilégio geral e especial.
Da interpretação desses dispositivos, entende-se que os créditos decorrentes de
honorários advocatícios, contratuais ou sucumbenciais, equiparam-se a créditos
trabalhistas para a habilitação em processo falimentar. Vale destacar que, por
força da equiparação, haverá o limite de valor para o recebimento – tal como
ocorre com os credores trabalhistas –, na forma preconizada pelo art. 83, I, da
Lei de Recuperação Judicial e Falência. Esse fator inibe qualquer possibilidade
de o crédito de honorários obter mais privilégio que o trabalhista, afastando
também suposta alegação de prejuízo aos direitos dos obreiros. Precedentes
citados do STJ: REsp 988.126-SP, Terceira Turma, DJe 6/5/2010; e REsp
793.245-MG, Terceira Turma, DJ 16/4/2007. REsp 1.152.218-RS, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 7/5/2014.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E
EMPRESARIAL. CLASSIFICAÇÃO DE CRÉDITO REFERENTE A HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS POR
SERVIÇOS PRESTADOS À MASSA FALIDA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES.
N. 8/2008-STJ).
São
créditos extraconcursais os honorários de advogado resultantes de trabalhos
prestados à massa falida, depois do decreto de falência, nos termos dos arts.
84 e 149 da Lei 11.101/2005. De
início, cumpre ressaltar que os credores da falida não se confundem com os
credores da massa falida. Os credores da falida são titulares de valores de
origem anterior à quebra, que devem ser habilitados no quadro geral de créditos
concursais pela regência da nova lei (art. 83 da Lei 11.101/2005). As dívidas
da massa falida, por sua vez, são créditos relacionados ao próprio processo de
falência, nascidos, portanto, depois da quebra, e pelo atual sistema legal
devem ser pagos antes dos créditos concursais (art. 84 da Lei 11.101/2005), com
exceção dos créditos trabalhistas de natureza estritamente salarial vencidos
nos três meses anteriores à decretação da falência, que serão pagos tão logo
haja disponibilidade em caixa (art. 151 da Lei 11.101/2005). Em outras
palavras, os serviços prestados à massa falida após a decretação da falência
são créditos extraconcursais (arts. 84 e 149 da Lei 11.101/2005), que devem ser
satisfeitos antes, inclusive, dos trabalhistas, à exceção do que dispõe o art.
151. REsp 1.152.218-RS, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 7/5/2014.
DIREITO EMPRESARIAL E
PROCESSUAL CIVIL. REPERCUSSÃO DA HOMOLOGAÇÃO DE PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
A
homologação do plano de recuperação judicial da devedora principal não implica
extinção de execução de título extrajudicial ajuizada em face de sócio
coobrigado. Com
efeito, a novação disciplinada na Lei 11.101/2005 é muito diversa da novação
prevista na lei civil. Se a novação civil faz, como regra, extinguir as
garantias da dívida, inclusive as reais prestadas por terceiros estranhos ao
pacto (art. 364 do CC), a novação decorrente do plano de recuperação judicial
traz, como regra, a manutenção das garantias (art. 59, caput,
da Lei 11.101/2005), sobretudo as reais, que só serão suprimidas ou
substituídas “mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva
garantia” por ocasião da alienação do bem gravado (art. 50, § 1º, da Lei
11.101/2005). Além disso, a novação específica da recuperação judicial
desfaz-se na hipótese de falência, quando então os “credores terão
reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente
contratadas” (art. 61, § 2º, da Lei 11.101/2005). O plano de recuperação
judicial opera, portanto, uma novação sui generis e sempre sujeita a uma condição
resolutiva, que é o eventual descumprimento do que ficou acertado no plano.
Dessa forma, embora o plano de recuperação judicial opere novação das dívidas a
ele submetidas, as garantias reais ou fidejussórias são, em regra, preservadas,
circunstância que possibilita ao credor exercer seus direitos contra terceiros
garantidores e impõe a manutenção das ações e execuções aforadas em face de
fiadores, avalistas ou coobrigados em geral. Ressalte-se, ainda, que não
haveria lógica no sistema se a conservação dos direitos e privilégios dos
credores contra coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (art. 49, § 1º,
da Lei 11.101/2005) dissesse respeito apenas ao interregno temporal entre o
deferimento da recuperação e a aprovação do plano, cessando esses direitos após
a concessão definitiva com a homologação judicial. REsp 1.326.888-RS, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 8/4/2014.
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