Após um longo período em que me dediquei aos estudos doutrinários e de legislação, para atender as necessidades acadêmicas de fim de curso e para atender também aos anseios de todo e qualquer estudante recém formado, desafiar os concursos públicos; hoje consigo parar um pouco para ler com calma os títulos que comprei há mais ou menos um ano e que estavam guardados na estante de livros, na parte de “metas para leitura”. Tenho o costume de comprar livros e mais livros e deixar para lê-los quando estou com um tempo disponível e com uma incrível vontade de ler algo diferente de códigos e manuais jurídicos-doutrinários.
Nesta estante estava desde o mês de novembro de 2009 (sei a data porque tenho o costume de colocá-la todas as vezes que adquiro ou ganho um livro, para lembrar as circunstâncias que eles chegaram até mim)... como eu ia dizendo, um livro que há muito tempo gostaria de ler e que somente agora consigo com calma desvendar suas primeiras páginas. Trata-se do livro de Rudolf Von Ihering, cujo título é a “A Luta pelo Direito”, que como ele mesmo diz no prefácio do livro, tratou de um discurso proferido na primavera de 1872 na Sociedade Jurídica de Viena, que foi publicado como livro no verão do mesmo ano.
Fiquei surpresa ao ver a data do livro, principalmente após desvendar seus dois primeiros capítulos, que apesar de escritos no final do século XIX são tão atuais que parece que foram escritos pelos atuais filósofos do direito, ou talvez não, porque alguns não se adéquam a sua maneira de pensar o direito: a luta!
Ihering nos dois primeiros capítulos me faz acreditar ainda mais no idealismo de luta por justiça. Luta que ao longo da história foi marcada por guerras, lutas sangrentas, até mesmo lutas psicológicas e contra os costumes que se solidificaram desde a Barbárie, passando pelo Direito Romanístico, até chegar aos dias de atuais, para podermos viver um direito tão belo como temos atualmente.
A sua visão é pela luta, pela transformação de valores, mas que muito se contrapõe as idéias de Savigny, para quem as transformações que advieram na sociedade não resultaram de lutas, mas de uma conformação dos sujeitos com determinadas situações e normas, como se os seres humanos apenas se sujeitassem e não fossem atores das modificações que ora presenciamos.
Longe de ser adepta das idéias de Savigny, assim como Ihering também não era, estou adorando a leitura, separei até um trecho do livro, que como uma parábola, me fez repensar o direito sobre uma égide diferente. Vejam e tirem suas próprias conclusões:
“É justamente a circunstância de que o direito não está ao alcance dos povos sem esforço; de que estes tem de lutar, combater e derramar seu sangue para a conquistá-lo; isso faz com que entre eles e seus direito se estabeleça o mesmo laço íntimo que liga o filho à mãe que empenhou a própria vida no seu nascimento. Um direito alcançado sem esforço equivale a uma criança trazida pela cegonha: o que essa ave traz pode perfeitamente ser carregado pela raposa ou pelo abutre. Mas a mãe não permitirá que roubem o filho que ela deu à luz; e o mesmo acontece com um povo que conquistou seu direito e suas instituições através de uma luta sangrenta. Podemos afirmar sem o menor receio que o amor que um povo dedica ao seu direito e a energia despendida na sua defesa são determinados pela intensidade do esforço e do trabalho que ele lhe custou. Os elos mais sólidos entre um povo e seu direito não são forjados pelo hábito, mas pelo sacrifício. E se Deus ama um povo, não lhe presenteia com aquilo de que precisa, nem lhe facilita o trabalho de alcançá-lo, mas torna-o mais difícil. Por isso mesmo, não hesito em afirmar que a luta necessária ao nascimento do direito não é nenhuma maldição, mas uma benção.” (p.34).
Esse direito que foi tão amplamente amado por Ihering, é o mesmo direito que temos hoje. O que me intrigou ao ler este trecho é perceber que ao longo dos anos, as pessoas estão preferindo ter um filho “trazido pela cegonha”, do que realmente sentir ele nascendo de dentro de si. Estão preferindo a maneira mais fácil de adquirir segurança na vida, do que o gosto de conquistá-la. Afinal tudo isso é direito. Ninguém contradiz essa idéia. Cada um tem o livre arbítrio e sua vontade maior ou menor de “lutar”.
Poucos são os que hoje querem que os ensinem a pescar. Quase todas as pessoas querem o peixe pronto e reclamam ferozmente quando não o colocam a sua frente. Este é o ponto combatido por Ihering no século XIX e que atualmente deveria ser combatido no século XXI.
A luta não pode ser deixada de lado. Quando deixamos de exigir nossos direitos justificando uma “paz social”, uma “pacificação das relações”, nesta renúncia quem sai perdendo não é só o sujeito que prefere sofrer a ação, todos perdem.
A luta pelo direito é uma obra fascinante. Por isso nem vou terminar essa postagem por aqui. Tenho certeza que mais conclusões terei ao longo da leitura deste livro e quero dividir minha impressões aqui.
Portanto, vamos à luta!!!
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