O Supremo Tribunal Federal estabeleceu recentemente a fixação da tese de inconstitucionalidade de atos de constrição do patrimônio de estatais prestadoras de serviço público essencial, em razão do disposto no artigo 100 da Constituição Federal, bem como dos princípios da separação dos poderes, legalidade orçamentária e eficiência administrativa.
Selecionamos o resumo do Informativo 1026/2021 que segue abaixo:
DIREITO
CONSTITUCIONAL – REGIME DE PRECATÓRIOS
Atos
de constrição de patrimônio de estatais prestadoras de serviço público
essencial sem fins lucrativos - ADPF 789/MA
Tese
fixada:
“Os
recursos públicos vinculados ao orçamento de estatais prestadoras de serviço
público essencial, em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo
primário, não podem ser bloqueados ou sequestrados por decisão judicial para
pagamento de suas dívidas, em virtude do disposto no art. 100 da CF/1988, e dos
princípios da legalidade orçamentária (art. 167, VI, da CF/1988), da separação
dos poderes (arts. 2º, 60, § 4º, III, da CF/1988) e da eficiência da
administração pública (art. 37, caput, da CF/1988).”
São
inconstitucionais atos de constrição, por decisão judicial, do patrimônio de
estatais prestadoras de serviço público essencial, em regime não concorrencial
e sem intuito lucrativo primário, para fins de quitação de suas dívidas. Com
efeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a
inconstitucionalidade dos bloqueios e sequestros de verba pública de estatais
por decisões judiciais, exatamente por estender o regime constitucional de
precatórios às estatais prestadoras de serviço público em regime não
concorrencial e sem intuito lucrativo (1). Da mesma forma, a Corte já assentou
orientação no sentido de que, salvo em situações excepcionais, não é possível
que, por meio de decisões judiciais constritivas, se altere a destinação de
recursos públicos previamente direcionados para a promoção de políticas públicas,
sob pena de afronta ao art. 167, VI, da CF (2) (3). Ressalte-se que a exigência
de lei para a modificação da destinação orçamentária de recursos públicos visa
resguardar o planejamento chancelado pelos Poderes Executivo e Legislativo no
momento de aprovação da lei orçamentária anual. Por isso, a interferência do
Judiciário na organização orçamentária dos projetos da Administração Pública —
salvo, excepcionalmente, como fiscalizador — ofende o princípio da separação
dos Poderes (CF, art. 2º) (4) (5). Por fim, no caso analisado, o princípio da
eficiência da Administração Pública (CF, art. 37, caput) (6) é igualmente
relevante para a solução da controvérsia. Isso porque os atos jurisdicionais
impugnados, ao bloquearem verbas orçamentárias da empresa pública estadual para
o pagamento de suas dívidas, atuaram como obstáculo ao exercício eficiente da
gestão pública, subvertendo o planejamento e a ordem de prioridades na execução
de políticas públicas de saúde, em momento dramático de combate à pandemia da
COVID-19. Com base nesse entendimento, o Plenário confirmou a cautelar
anteriormente deferida e julgou procedente o pedido formulado em arguição de
descumprimento de preceito fundamental para: (i) suspender as decisões
judiciais nas quais se promoveram constrições patrimoniais por bloqueio,
penhora, arresto, sequestro; (ii) determinar a sujeição da Empresa Maranhense
de Serviços Hospitalares – EMSERH ao regime constitucional de precatórios; e
(iii) determinar a imediata devolução das verbas subtraídas dos cofres públicos,
e ainda em poder do Judiciário, para as respectivas contas de que foram
retiradas.
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(1)
Precedentes citados: ADPF 556; ADPF 485. (2) CF: “Art. 167. São vedados: (...)
VI - a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria
de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização
legislativa;” (3) Precedentes citados: ADPF 620; ADPF 275; ADPF 556. (4) CF:
“Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o
Legislativo, o Executivo e o Judiciário.” (5) Precedente citado: ADPF 114. (6)
CF: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência
e, também, ao seguinte: (...)”