DIREITO DO CONSUMIDOR.
RESPONSABILIDADE DE HOSPITAL POR DANOS DECORRENTES DE TRANSFUSÃO DE SANGUE.
O
hospital que realiza transfusão de sangue com a observância de todas as
cautelas exigidas por lei não é responsável pelos danos causados a paciente por
futura manifestação de hepatite C, ainda que se considere o fenômeno da janela
imunológica. Os
estabelecimentos hospitalares são fornecedores de serviços, respondendo
objetivamente pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos
dos serviços. Relativamente às transfusões sanguíneas, a doutrina especializada
esclarece que ainda não é possível a eliminação total dos riscos de transfusão
de sangue contaminado, mesmo que se adotem todos os testes adequados à análise
sanguínea. Por isso, não sendo absoluta a segurança que o consumidor
razoavelmente pode esperar nesses casos, o só fato da existência do fenômeno da
janela imunológica não é passível de tornar defeituoso o serviço prestado pelo
hospital. REsp 1.322.387-RS, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 20/8/2013.
DIREITO EMPRESARIAL. TERMO
INICIAL DOS JUROS DE MORA RELATIVOS A CRÉDITO VEICULADO EM CHEQUE.
Os
juros de mora sobre a importância de cheque não pago contam-se da primeira
apresentação pelo portador à instituição financeira, e não da citação do
sacador. A mora ex
re independe de
qualquer ato do credor, como interpelação ou citação, porquanto decorre do
próprio inadimplemento de obrigação positiva, líquida e com termo implementado,
desde que não seja daquelas em que a própria lei afasta a constituição de mora
automática. Assim, em se tratando de mora ex re, aplica-se o antigo
e conhecido brocardo dies interpellat pro homine (o termo interpela no lugar do
credor). Com efeito, fica límpido que o art. 219 do CPC, assim como o 405 do
CC, deve ser interpretado à luz do ordenamento jurídico, tendo aplicação
residual para casos de mora ex persona – evidentemente, se ainda não houve a
prévia constituição em mora por outra forma legalmente admitida. Assim, citação
implica caracterização da mora apenas se ela já não tiver ocorrido pela
materialização de uma das diversas hipóteses indicadas no ordenamento jurídico.
No caso, a matéria referente aos juros relativos à cobrança de crédito
estampado em cheque por seu portador é regulada pela Lei do Cheque, que
estabelece a incidência dos juros de mora a contar da primeira apresentação do
título (art. 52, II). Ademais, por materializar uma ordem a terceiro para
pagamento à vista, o momento natural de realização do cheque é a apresentação
(art. 32), quando a instituição financeira verifica a existência de
disponibilidade de fundos (art. 4º, § 1º), razão pela qual a apresentação é
necessária. REsp 1.354.934-RS, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 20/8/2013.
DIREITO DO CONSUMIDOR. COBRANÇA POR HOSPITAL DE VALOR ADICIONAL PARA
ATENDIMENTOS FORA DO HORÁRIO COMERCIAL.
O hospital não pode cobrar, ou admitir que se cobre, dos pacientes
conveniados a planos de saúde valor adicional por atendimentos realizados por
seu corpo médico fora do horário comercial. A pedra de toque do
direito consumerista é o princípio da vulnerabilidade do consumidor, mormente
no que tange aos contratos. Nesse contexto, independentemente do exame da
razoabilidade/possibilidade de cobrança de honorários médicos majorados para
prestação de serviços fora do horário comercial, salta aos olhos que se trata
de custos que incumbem ao hospital. Este, por conseguinte, deveria cobrar por
seus serviços diretamente das operadoras de plano de saúde, e não dos
particulares/consumidores. Além disso, cabe ressaltar que o consumidor, ao
contratar um plano de seguro de assistência privada à saúde, tem a legítima
expectativa de que, no tocante aos procedimentos médico-hospitalares cobertos,
a empresa contratada arcará com os custos necessários, isto é, que haverá
integral assistência para a cura da doença. No caso, cuida-se de cobrança
iníqua, em prevalecimento sobre a fragilidade do consumidor, de custo que
deveria estar coberto pelo preço exigido da operadora de saúde – negócio
jurídico mercantil do qual não faz parte o consumidor usuário do plano de saúde
–, caracterizando-se como conduta manifestamente abusiva, em violação à boa-fé
objetiva e ao dever de probidade do fornecedor, vedada pelos arts. 39, IV, X, e
51, III, IV, X, XIII, XV, do CDC e 422 do CC. Ademais, na relação mercantil
existente entre o hospital e as operadoras de planos de saúde, os contratantes
são empresários – que exercem atividade econômica profissionalmente –, não
cabendo ao consumidor arcar com os ônus/consequências de eventual equívoco
quanto à gestão empresarial. REsp 1.324.712-MG, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 24/9/2013.
DIREITO DO CONSUMIDOR. EXIGÊNCIA DE CAUÇÃO PARA ATENDIMENTO MÉDICO DE
EMERGÊNCIA.
É incabível a exigência de caução para atendimento médico-hospitalar
emergencial. Antes mesmo da vigência da Lei 12.653/2012, a Quarta Turma do STJ
(REsp 1.256.703-SP, DJe 27/9/2011) já havia se manifestado no sentido de que é
dever do estabelecimento hospitalar, sob pena de responsabilização cível e
criminal, da sociedade empresária e prepostos, prestar o pronto atendimento.
Com a superveniente vigência da Lei 12.653/2012, que veda a exigência de caução
e de prévio preenchimento de formulário administrativo para a prestação de atendimento
médico-hospitalar premente, a solução para o caso é expressamente conferida por
norma de caráter cogente. REsp 1.324.712-MG, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 24/9/2013.
DIREITO DO CONSUMIDOR.
ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RECURSO
REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
Em
contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao CDC, é abusiva a
cláusula contratual que determine, no caso de resolução, a restituição dos
valores devidos somente ao término da obra ou de forma parcelada,
independentemente de qual das partes tenha dado causa ao fim do negócio. De fato, a despeito da
inexistência literal de dispositivo que imponha a devolução imediata do que é
devido pelo promitente vendedor de imóvel, inegável que o CDC optou por
fórmulas abertas para a nunciação das chamadas "práticas abusivas" e
"cláusulas abusivas", lançando mão de um rol meramente
exemplificativo para descrevê-las (arts. 39 e 51). Nessa linha, a
jurisprudência do STJ vem proclamando serem abusivas situações como a ora em
análise, por ofensa ao art. 51, II e IV, do CDC, haja vista que poderá o
promitente vendedor, uma vez mais, revender o imóvel a terceiros e, a um só
tempo, auferir vantagem com os valores retidos, além da própria valorização do
imóvel, como normalmente acontece. Se bem analisada, a referida cláusula parece
abusiva mesmo no âmbito do direito comum, porquanto, desde o CC/1916 – que foi
reafirmado pelo CC/2002 –, são ilícitas as cláusulas puramente potestativas,
assim entendidas aquelas que sujeitam a pactuação "ao puro arbítrio de uma
das partes" (art. 115 do CC/1916 e art. 122 do CC/2002). Ademais, em
hipóteses como esta, revela-se evidente potestatividade, o que é considerado
abusivo tanto pelo art. 51, IX, do CDC quanto pelo art. 122 do CC/2002. A
questão relativa à culpa pelo desfazimento da pactuação resolve-se na
calibragem do valor a ser restituído ao comprador, não pela forma ou prazo de
devolução. Tese firmada para fins do art. 543-C do CPC: “Em contratos
submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, é abusiva a cláusula contratual
que determina a restituição dos valores devidos somente ao término da obra ou
de forma parcelada, na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra
e venda de imóvel, por culpa de quaisquer contratantes. Em tais avenças, deve
ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador –
integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou
parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.”
Precedentes citados: AgRg no Ag 866.542-SC, Terceira Turma, DJe 11/12/2012;
REsp 633.793-SC, Terceira Turma, DJ 27/6/2005; e AgRg no REsp 997.956-SC,
Quarta Turma, DJe 02/8/2012. REsp 1.300.418-SC, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 13/11/2013.
DIREITO EMPRESARIAL. PRAZO PRESCRICIONAL PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO
MONITÓRIA FUNDADA EM CHEQUE PRESCRITO. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E
RES. 8/2008-STJ).
O prazo para ajuizamento de ação monitória em face do emitente de cheque
sem força executiva é quinquenal, a contar do dia seguinte à data de emissão
estampada na cártula. Com efeito, qualquer dívida resultante de documento
público ou particular, tenha ou não força executiva, submete-se ao prazo
prescricional de cinco anos, que está previsto no art. 206, § 5º, I, do CC.
Cabe registrar que o cheque é ordem de pagamento à vista que resulta na
extinção da obrigação originária, devendo conter a data de emissão da cártula –
requisito essencial para que produza efeito como cheque (art. 1º, V, da Lei 7.357/1985
– Lei do Cheque). O art. 132 do CC ainda esclarece que, salvo disposição legal
ou convencional em contrário, computam-se os prazos, excluído o dia do começo e
incluído o do vencimento. Assim, o termo inicial para a fluência do prazo
prescricional para a perda da pretensão relativa ao crédito concernente à
obrigação originária corresponde ao dia seguinte àquele constante no cheque
(ordem de pagamento à vista) como data de emissão – quando, então, se pode
cogitar inércia por parte do credor. REsp 1.101.412-SP, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/12/2013.
DIREITO EMPRESARIAL. PRAZO PRESCRICIONAL PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO MONITÓRIA
FUNDADA EM NOTA PROMISSÓRIA PRESCRITA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E
RES. 8/2008-STJ).
O prazo para ajuizamento de ação monitória em face do emitente de nota
promissória sem força executiva é quinquenal, a contar do dia seguinte ao vencimento
do título. Com efeito, qualquer dívida resultante de documento público ou
particular, tenha ou não força executiva, submete-se ao prazo prescricional de
cinco anos, que está previsto no art. 206, § 5º, I, do CC. Cabe registrar que a
nota promissória é título de crédito abstrato, isto é, pode ser emitida em
decorrência de qualquer negócio jurídico e o seu pagamento resulta na extinção
da obrigação originária. O art. 132 do CC ainda esclarece que, salvo disposição
legal ou convencional em contrário, computam-se os prazos, excluído o dia do
começo e incluído o do vencimento. Assim, o termo inicial para a fluência do
prazo prescricional para a perda da pretensão relativa ao crédito concernente à
obrigação originária corresponde ao dia seguinte àquele previsto na cártula
para o pagamento do título de crédito – quando, então, se pode cogitar inércia
por parte do credor. REsp 1.262.056-SP, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/12/2013.
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA PENAL EM CONTRATO
DE PACOTE TURÍSTICO.
É abusiva a cláusula penal de contrato de pacote turístico que
estabeleça, para a hipótese de desistência do consumidor, a perda integral dos
valores pagos antecipadamente. De fato, não é possível falar em
perda total dos valores pagos antecipadamente por pacote turístico, sob pena de
se criar uma situação que, além de vantajosa para a empresa de turismo
(fornecedora de serviços), mostra-se excessivamente desvantajosa para o consumidor,
o que implica incidência do art. 413 do CC/2002, segundo o qual a penalidade
deve obrigatoriamente (e não facultativamente) ser reduzida equitativamente
pelo juiz se o seu montante for manifestamente excessivo. Ademais, o STJ tem o
entendimento de que, em situação semelhante (nos contratos de promessa de
compra e venda de imóvel), é cabível ao magistrado reduzir o percentual da
cláusula penal com o objetivo de evitar o enriquecimento sem causa por qualquer
uma das partes. Além disso, no que diz respeito à relação de consumo,
evidencia-se, na hipótese, violação do art. 51, II e IV, do CDC, de acordo com
o qual são nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas ao
fornecimento de produtos e serviços que subtraiam ao consumidor a opção de
reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código, ou que
estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o
consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a
equidade. Nesse contexto, cabe ressaltar o disposto no art. 51, § 1º, III, do
CDC: presume-se exagerada a vantagem que “se mostra excessivamente onerosa para
o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse
das partes e outras circunstâncias peculiares do caso”. Por fim, cabe afirmar,
também, que o cancelamento de pacote turístico contratado constitui risco do
empreendimento desenvolvido por qualquer agência de turismo, não podendo esta
pretender a transferência integral do ônus decorrente de sua atividade empresarial
a eventuais consumidores. REsp 1.321.655-MG, Rel.
Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 22/10/2013.
DIREITO DO CONSUMIDOR. COMERCIALIZAÇÃO DE VEÍCULO REESTILIZADO.
O consumidor que, em determinado ano, adquire veículo cujo modelo seja
do ano ulterior não é vítima de prática comercial abusiva ou propaganda
enganosa pelo simples fato de, durante o ano correspondente ao modelo do seu
veículo, ocorrer nova reestilização para um modelo do ano subsequente. Em princípio, é
lícito ao fabricante de veículos antecipar o lançamento de um modelo meses
antes da virada do ano, prática usual no mercado de veículos. Realmente, de
acordo com a Terceira Turma do STJ (REsp 1.342.899-RS, DJe 9/9/2013), ocorre
prática comercial abusiva e propaganda enganosa na hipótese em que coexistam,
em relação ao mesmo veículo, dois modelos diferentes, mas datados com o mesmo
ano. Todavia, esse entendimento não tem aplicabilidade na hipótese em análise,
visto que se trata de situação distinta, na qual a nova reestilização do
produto alcança apenas veículos cujos modelos sejam datados com ano posterior à
data do modelo do veículo anteriormente comercializado. REsp 1.330.174-MG, Rel.
Min. Sidnei Beneti, julgado em 22/10/2013.
DIREITO DO CONSUMIDOR. PRAZO PARA RECLAMAR DE VÍCIOS APARENTES OU DE
FÁCIL CONSTATAÇÃO PRESENTES EM VESTIDO DE NOIVA.
Decai em noventa dias, a contar do dia da entrega do produto, o direito
do consumidor de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação
presentes em vestido de noiva. Os critérios legais para a fixação do
prazo decadencial para reclamação de vícios aparentes ou de fácil constatação
leva em consideração a durabilidade ou não do produto ou serviço. Assim, se o
produto for durável, o prazo será de 90 dias, caso contrário, se não durável, o
prazo será de 30 dias (art. 26 do CDC). Ressalte-se que vício aparente ou de
fácil constatação é aquele que não exige do consumidor médio nenhum
conhecimento especializado ou apreciação técnica (perícia), por decorrer de
análise superficial do produto (simples visualização ou uso), cuja constatação
é verificável de plano, a partir de um simples exame do bem ou serviço, por
mera experimentação ou por “saltar aos olhos” ostensivamente sua inadequação. Ademais,
entende-se por produto durável aquele que, como o próprio nome consigna, não se
extingue pelo uso, levando certo tempo para se desgastar, que variará conforme
a qualidade da mercadoria, os cuidados que lhe são emprestados pelo usuário, o
grau de utilização e o meio ambiente no qual inserido. Portanto, natural que um
terno, um eletrodoméstico, um automóvel ou até mesmo um livro, à evidência
exemplos de produtos duráveis, se desgastem com o tempo, já que a finitude, é
de certo modo, inerente a todo bem. Por outro lado, os produtos não duráveis,
tais como alimentos, os remédios e combustíveis, em regra in natura,
findam com o mero uso, extinguindo-se em um único ato de consumo. Assim, por
consequência, nos produtos não duráveis o desgaste é imediato. Diante disso, o
vestido de noiva deve ser classificado como um bem durável, pois não se
extingue pelo mero uso, sendo notório que, por seu valor sentimental, há quem o
guarde para a posteridade, muitas vezes com a finalidade de vê-lo reutilizado
em cerimônias de casamento por familiares (filhas, netas e bisnetas) de uma
mesma estirpe. Há pessoas, inclusive, que mantêm o vestido de noiva como
lembrança da escolha de vida e da emoção vivenciada no momento do enlace
amoroso, enquanto há aquelas que o guardam para uma possível reforma, seja por
meio de aproveitamento do material (normalmente valioso), do tingimento da
roupa (cujo tecido, em regra, é de alta qualidade) ou, ainda, para extrair
lucro econômico, por meio de aluguel (negócio rentável e comum atualmente).
Assim, existindo vício aparente ou de fácil constatação em vestido de noiva,
incide o prazo de 90 dias, aplicável aos bens duráveis (art. 26, II, do CDC). REsp 1.161.941-DF, Rel.
Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 5/11/2013.
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