segunda-feira, 1 de março de 2021

STJ: Dono de veículo apreendido por crime ambiental não tem o direito automático de ficar como depositário

Notícia divulgada pelo site do STJ, sobre análise de Recurso Repetitivo - Tema 1043. 

Link para acesso a publicação original (clique aqui)


Imagem da PRF realizando apreensão de madeira irregular. Fonte: Globo.com



A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento de recursos especiais repetitivos (Tema 1.043), estabeleceu a tese de que o proprietário do veículo apreendido em razão de transporte irregular de madeira não possui o direito subjetivo de ser nomeado fiel depositário do bem, cabendo à administração pública a adoção ​das providências previstas nos artigos 105 e 106 do Decreto 6.514/2008, conforme seu juízo de oportunidade e conveniência.

Com a fixação da tese, as ações com a mesma controvérsia que estavam suspensas em todo o país poderão ser resolvidas com base no precedente qualificado firmado pela seção.


Excepcionalidade


Em relação aos dispositivos do Decreto 6.514/2008, o ministro Campbell ressaltou que é no interesse da administração pública que o veículo apreendido, excepcionalmente, pode ser entregue em depósito a terceiro.

Segundo o relator, a "ordem natural das coisas" é que, tendo havido a infração ambiental, o infrator perca o seu produto e os instrumentos utilizados nessa prática (artigo 25 da Lei 9.605/1998) – os quais passarão, portanto, ao patrimônio do poder público. Este, porém, excepcionalmente, pode entregar a posse dos bens a um fiel depositário, até a conclusão do processo administrativo.

Assim, de acordo com o ministro, a cessão da posse do instrumento utilizado na infração ambiental é "uma faculdade da administração pública, por se tratar de um bem que, em tese, integrará o patrimônio do poder público, na medida em que tomado do particular infrator, e desde que confirmados os fatos em processo administrativo, de maneira que é essa potencialidade que deve orientar a preponderância dos interesses".


Esvaziamento

Mauro Campbell Marques apontou que o artigo 106 do decreto não determina quem deve ser o fiel depositário do bem, já que confere à administração pública a prerrogativa de escolher entre órgãos e entidades de caráter ambiental, beneficente ou científico, entre outros, além do próprio infrator, caso não haja risco de utilização em novos ilícitos.

Para o ministro, se fosse reconhecido o direito automático do infrator ao depósito, a administração ficaria privada dessa escolha; além disso, poderia haver o esvaziamento da norma de proteção ambiental, tendo em vista que a apreensão tem como finalidade não apenas interromper o crime, mas impedir que o instrumento seja utilizado em novo delito. 

"O sujeito que é pego transportando madeira de forma irregular, se permanece com o veículo utilizado na infração, pode muito bem utilizá-lo em conduta reincidente, daí que compete ao poder público avaliar se o bem fica consigo enquanto perdurar razoavelmente o processo administrativo, ou se o bem pode ir a depósito de terceiro, e de qual terceiro se trata, tudo isso devidamente fundamentado", declarou o relator.

Ele ponderou que o cidadão não pode ficar sujeito a eventuais abusos do poder público, como processos intermináveis ou uma indefinição muito longa sobre o próprio cometimento da infração. Entretanto, enfatizou que esse tipo de situação não se resolve com a entrega automática do bem ao eventual infrator, mas pelos meios adequados, como requerimentos administrativos ou até mesmo o pedido de intervenção do Judiciário. ​


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1805706REsp 1814947

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

Novas súmulas - STJ: 643 e 644

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

TERCEIRA SEÇÃO

A Terceira Seção, na sessão ordinária de 10 de fevereiro de 2021, aprovou os seguintes enunciados de súmula, que serão publicados no Diário da Justiça eletrônico do Superior Tribunal de Justiça, por três vezes, em datas próximas, nos termos do art. 123 do RISTJ.

SÚMULA N. 643

A execução da pena restritiva de direitos depende do trânsito em julgado da condenação.

Fonte: eDJ-STJ, Edição n. 3090, quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021.


 

SÚMULA N. 644

O núcleo de prática jurídica deve apresentar o instrumento de mandato quando constituído pelo réu hipossuficiente, salvo nas hipóteses em que é nomeado pelo juízo.

Fonte: eDJ-STJ, Edição n. 3090, quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021.


STJ: Contrato de serviços advocatícios não pode estipular penalidade para rompimento unilateral

 Notícia originalmente publicada no site do STJ (link)


Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no contrato de honorários advocatícios, não é possível a estipulação de penalidade para as hipóteses de renúncia ou revogação unilateral do mandato do advogado, independentemente de motivação, respeitado o direito de recebimento dos honorários proporcionais ao serviço prestado.

Com base nesse entendimento, o colegiado reformou o acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS).

No caso analisado pela turma, o contrato de prestação de serviços advocatícios tinha previsão de vencimento antecipado do valor integral dos honorários na hipótese de revogação unilateral do mandato por parte da cliente.

Os embargos opostos pela cliente à execução movida pela firma de advocacia foram julgados improcedentes em primeiro grau. O TJMS confirmou a sentença sob o argumento de que o contrato trazia disposição expressa de necessidade do pagamento do valor integral dos honorários na hipótese de revogação antecipada, caracterizando-se como título líquido, certo e exigível.

No recurso especial, a cliente alegou violação à função social dos contratos, ausência de certeza, liquidez e exigibilidade do título em execução e vulneração do princípio da confiança que deve nortear a relação cliente-advogado, em razão de cláusula que visava à vinculação dos contratantes de forma permanente.


Confiança recíproca

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, o Código de Ética e Disciplina da OAB prevê no artigo 16 – em relação ao profissional – a possibilidade de renúncia a patrocínio sem a necessidade de mencionar os motivos, sendo o mesmo raciocínio aplicável à hipótese de revogação unilateral do mandato por parte do cliente (artigo 17).

"Considerando que a advocacia não é atividade mercantil e não vislumbra exclusivamente o lucro, bem como que a relação entre advogado e cliente é pautada na confiança de cunho recíproco, não é razoável – caso ocorra a ruptura do negócio jurídico por meio de renúncia ou revogação unilateral do mandato – que as partes fiquem vinculadas ao que fora pactuado sob a ameaça de cominação de penalidade", observou.


Cláusula penal

Ao reformar o acórdão no ponto que tratou da validade da cobrança integral dos honorários contratados, a ministra destacou que a decisão de segunda instância acabou por referendar a aplicação de cláusula penal na situação de exercício de um direito potestativo – o qual não admite contestação, pois é prerrogativa jurídica de impor a outrem a sujeição ao seu exercício – por parte da cliente, materializado na revogação unilateral do mandato.

"A incidência da penalidade constante na referida cláusula contratual criou a situação, inusitada e antijurídica, de vinculação da recorrente/cliente de maneira permanente a uma relação contratual – ​nos termos do que fora descrito anteriormente – regida pela confiança recíproca, ausente de natureza mercantil e que não vislumbra exclusivamente o lucro. Dessa forma, o acórdão recorrido merece reforma", declarou.

Nancy Andrighi acrescentou que o título de crédito, no caso, não tem força executiva, pois não preenche todos os requisitos do artigo 783 do Código de Processo Civil, já que se fundamenta em contrato com cláusula inexigível – o que acarreta a iliquidez do crédito cobrado.

De forma unânime, a turma deu parcial provimento ao recurso especial, julgou procedentes os embargos à execução e declarou extinta a execução, sem prejuízo do ajuizamento de eventual ação de conhecimento para arbitramento de honorários. 

Leia o acórdão.


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1882117

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Princípio da autonomia e independência: STJ afirma que cooperativa central e conselheiros fiscais não respondem solidariamente por obrigações de cooperativa singular

 


Por Giselle Borges Alves*


Na publicação realizada neste blog no dia 20 de fevereiro de 2021 (link) foram ressaltadas as características dos princípios cooperativistas e como eles influenciam a organização, gestão e as normas aplicáveis às cooperativas.

Nesta segunda-feira, 22, o STJ trouxe notícia que remete à aplicação concreta do princípio da autonomia e independência das cooperativas, analisando seus vieses interpretativos. 

Como sabemos, a autonomia e independência das cooperativas garante que não hajam ingerências externas nas decisões tomadas por estas, o que também atrai a noção de responsabilidade exclusiva pelos atos que a cooperativa e seus gestores praticam no mercado, sob a égide desta autonomia organizacional e de gestão do empreendimento. Como sempre direitos geram deveres correlatos. Obrigações geram responsabilidade e limitações de atuação.

Neste sentido, o STJ apenas consagrou no julgamento do Recurso Especial 1778048, proveniente do TJMT, a independência e autonomia das Cooperativas Singulares em relação às Cooperativas Centrais, o que se aplica por extensão também para Federações e Confederações de Cooperativas, na medida que as cooperativas devem ser singularmente consideradas, diante da própria autonomia e independência na tomada de decisões. Assim, inaplicável a responsabilidade solidária entre Centrais e Cooperativas Singulares, ao menos em termos de direitos dos associados/cooperados, já que este foi o caso em análise no Recurso Especial.

No entanto, é preciso ponderar outras hipóteses de aplicação ou não da solidariedade, quando envolvam, por exemplo, direitos de consumidores, direitos trabalhistas de funcionários de cooperativas, entre outras searas obrigacionais e de responsabilidade. Por isso é sempre bom acompanhar a evolução da jurisprudência sobre o tema.

Abaixo segue a notícia completa e o link para acesso ao inteiro teor do acórdão do RESP 1778048.


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STJ - Decisão - 22/02/2021

Cooperativa central e conselheiros fiscais não respondem solidariamente por obrigações de cooperativa singular

Por unanimidade, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu não haver responsabilidade solidária de cooperativa central na hipótese de liquidação de uma cooperativa singular a ela filiada. Ao reformar a​córdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), o colegiado também decidiu que os membros do conselho fiscal da cooperativa singular liquidada não são responsáveis pelos prejuízos suportados pelo cooperado.

O recurso julgado se originou de ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada por um cooperado contra a Central das Cooperativas de Crédito dos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (Sicoob Central MT/MS), a Cooperativa de Crédito Rural do Pantanal Ltda. e os administradores e integrantes do conselho fiscal desta última.

Segundo o processo, o cooperado fez aplicação financeira na Cooperativa Rural do Pantanal. Antes da data prevista para o resgate, a cooperativa encerrou suas atividades, e o dinheiro investido ficou bloqueado. A sentença condenou os administradores, a cooperativa central e a cooperativa singular, solidariamente, a restituir o valor aplicado e a pagar indenização por danos morais. O TJMT reformou parcialmente a sentença, para reconhecer a responsabilidade solidária dos demais réus, membros do Conselho Fiscal.

No recurso especial submetido ao STJ, a Sicoob Central MT/MS sustentou que os negócios firmados pela cooperativa singular são de sua exclusiva responsabilidade, não havendo solidariedade com a cooperativa central. Os integrantes do conselho fiscal da Cooperativa do Pantanal também apresentaram recurso especial requerendo a exclusão de sua responsabilidade.

Independência

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, o sistema cooperativo de crédito tem a finalidade de permitir acesso ao crédito e a realização de determinadas operações financeiras no âmbito de uma cooperativa, a fim de beneficiar seus associados. Ela afirmou que, ao longo de sua evolução normativa, foram privilegiadas a independência e a autonomia das cooperativas singulares, das centrais e das confederações.

Nos termos da regulamentação vigente – ressaltou Nancy Andrighi –, as cooperativas centrais do sistema cooperativo de crédito devem, entre outras funções, supervisionar o funcionamento das cooperativas singulares, em especial o cumprimento das normas que regem esse sistema.

"No entanto, sua atuação encontra um limite máximo, que é a impossibilidade de substituir a administração da cooperativa de crédito singular que apresenta problemas de gestão", completou.

De acordo com a magistrada, não há na legislação nenhum dispositivo que estabeleça responsabilidade solidária entre os diferentes órgãos que compõem o sistema de crédito cooperativo. "Eventuais responsabilidades de cooperativas centrais e de bancos cooperativos devem ser apuradas nos limites de suas atribuições legais e regulamentares", acrescentou.

Culpa ou dolo

A ministra destacou que o artigo 39 da Lei 6.024/1974 trata, única e exclusivamente, de responsabilidade subjetiva dos administradores e dos conselheiros fiscais da instituição financeira por seus atos ou omissões em que houver culpa ou dolo.

Segundo Nancy Andrighi, a melhor interpretação para a lei que trata da intervenção e da liquidação extrajudicial de instituições financeiras exclui os membros do conselho fiscal da responsabilidade solidária prevista para os administradores no artigo 40, restando, em relação aos conselheiros, apenas o disposto no artigo 39.

"Na hipótese em julgamento, tal conclusão implica a impossibilidade de se declarar a solidariedade dos membros do conselho fiscal pelos prejuízos causados com a liquidação da cooperativa singular, especialmente porque fundamentada apenas em uma suposta demora em sua atuação", disse a relatora.

Ao dar provimento aos recursos, a turma afastou a responsabilidade da Sicoob Central MT/MS e dos integrantes do conselho fiscal da cooperativa singular pelos prejuízos causados ao cooperado.

Leia o acordão.

Fonte da notícia: link



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*Giselle Borges Alves, Mestra em Direito pela Universidade de Brasília. Advogada, servidora pública e professora de disciplinas relacionadas ao Direito Privado e Direito Cooperativo.

sábado, 20 de fevereiro de 2021

A BASE PRINCIPIOLÓGICA DO COOPERATIVISMO

 

Logomarca mundial do Cooperativismo. Fonte: ACI.


Giselle Borges Alves

Professora de Direito Cooperativo e Direito Privado

Mestre em Direito pela Universidade de Brasília (UnB)

 

O cooperativismo antes de ser compreendido como forma de desenvolvimento de atividades econômicas, precisa ser vislumbrando também como movimento que possui uma base filosófica secular. Neste sentido, a doutrina cooperativista ressalta a importância de conhecer o cooperativismo antes de empreender ponderações sobre a forma de atuação de uma cooperativa[1].

Enquanto movimento e filosofia, o cooperativismo nasceu em meio às revoluções operárias da Europa, inicialmente pensado sobre bases solidaristas inspirados pelos ideais franceses. Teve berço nos movimentos socialistas europeus, mas se fortaleceu e expandiu sobre a égide do capitalismo, no entanto, sem abandonar os pilares de união de forças sobre o prisma democrático de gestão, melhor remuneração do trabalho e fortalecimento do olhar comunitário, para além da simples geração de lucro (NAMORADO, 2013; MEINEN et al., 2002).

Mesmo diante do cenário da globalização de mercados, as cooperativas continuam tendo como alicerces de formação e atuação sete princípios básicos fundamentais[2], cunhados pela primeira cooperativa do mundo – a Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale, criada em 1844 na Inglaterra (CENZI, 2009).

Os sete princípios cooperativistas, em verdade traçam não apenas a base filosófica do movimento, mas sobretudo, pautam a forma de organização e gestão dos empreendimentos cooperativistas em todo o mundo. Ofertam, assim, identidade ao movimento, tendo em vista que são comuns a todos os ramos de atividades e funcionam como normas básicas.

O primeiro princípio cooperativista é o princípio da adesão livre e voluntária, comumente conhecido também como “princípio da porta aberta”. Este princípio estabelece que as cooperativas são organizações voluntárias abertas a todas as pessoas aptas a utilizar os seus serviços e assumir as responsabilidades do empreendimento como membros, proibindo a discriminação sexual, social, racial, política ou religiosa.

O segundo princípio cooperativista é o princípio da gestão democrática pelos membros. Esse princípio consagra a base democrática do empreendimento cooperativista, que possui controle realizado por todos os membros, que participam ativamente na formulação de suas políticas e na tomada de decisões. Os membros eleitos como representantes dos demais associados são responsáveis perante estes.

Nas cooperativas singulares, os membros, independemente da quantidade de capital que possuem na cooperativa, possuem igual direito de voto (um membro, um voto). Nas cooperativas Centrais, Federações e Confederações também existe uma organização proporcional de direito de voto em base democrática.

A gestão democrática, portanto, traduz-se em um sistema de decisões majoritárias e não no poder de decisão do capital investido, o que é muito comum nas sociedades de natureza mercantil. Nas cooperativas não temos a figura do sócio majoritário, mas sim uma gestão participativa e democrática como um dos eixos desse movimento, consagrando o sistema de autogestão. Aliás, a submissão das decisões estratégicas da cooperativa à assembleia é o pressuposto básico da autogestão como forma de governança (ALVES, 2017).

O terceiro princípio é o princípio da participação econômica dos membros. Por ele é estabelecida a forma de contribuição equitativa dos membros para o capital das cooperativas, bem como, novamente, ressalta o controle democrático. Parte do capital aportado na cooperativa é propriedade comum, no entanto, os membros recebem habitualmente, se houver sobras, uma remuneração como condição de adesão.

Nas cooperativas está estabelecido o retorno das sobras líquidas proporcional ao trabalho realizado pelo cooperado junto à cooperativa durante o exercício social com divisão pro rata de suas operações[3], o que difere profundamente do retorno dos lucros numa sociedade de natureza mercantil, onde há estreita relação com o capital investido pelo sócio ou acionista, pouco importando se este trabalhou na empresa durante qualquer período (PINHO, 1977).

As sobras e resultados de um exercício social de uma cooperativa também podem ser destinados aos objetivos desta, mediante as políticas aprovadas pelos seus membros em deliberações nas assembleias gerais. Por exemplo, os cooperados podem destinar sobras e resultados ao desenvolvimento de suas cooperativas, mediante a criação de fundos de reserva, podem deliberar pelo rateio das sobras e resultados entre os cooperados ou apoiar outras atividades em prol dos cooperados, funcionários e da comunidade – concessão de bolsas de estudos, apoio a ações e projetos sociais, entre outros –, bem como realizar investimentos externos com o objetivo de captação de recursos em benefício geral da cooperativa.

O quarto princípio cooperativista trata da autonomia e independência destas, ou seja, estabelece as cooperativas como organizações autônomas, de ajuda mútua, controladas pelos seus membros. Decorre deste princípio a conclusão de que as cooperativas, mesmo se firmarem acordos com outras organizações, incluindo instituições públicas, ou se recorrerem a capital externo, devem fazê-lo de forma a preservar o controle democrático pelos membros da cooperativa, mantendo sua autonomia e independência quanto a ingerências externas.

O quinto princípio cooperativista é o princípio da educação, formação e informação para o cooperativismo. As cooperativas devem promover a educação e formação técnico-profissional dos seus associados, dos representantes por eles eleitos, dos seus trabalhadores e também da sociedade em geral. A educação, formação e informação cooperativista contribui de forma eficaz para o desenvolvimento das próprias cooperativas e para a continuidade do movimento. Informa ao público em geral, incluindo jovens e líderes comunitários, sobre a natureza e vantagens da cooperação, auxilia no crescimento e fortalecimento do cooperativismo ao longo do tempo.

O sexto princípio é a intercooperação, que se traduz no trabalho conjunto e coeso das cooperativas entre si, servindo de forma mais eficaz aos seus membros e ofertando mais força ao cooperativismo enquanto movimento. O princípio incentiva que as cooperativas trabalhem em conjunto por intermédio de estruturas locais, regionais, nacionais e internacionais. No Brasil, temos a intercooperação realizada mediante relações contratuais, por exemplo, de compra e venda de insumos entre cooperativas, prestação de serviços, entre outros. Mas também temos a verticalização das atividades que fornecem melhor estrutura para que as cooperativas singulares prestem seus serviços aos associados. Estamos falando da constituição de Centrais, Federações e Confederações de Cooperativas, cujas normas gerais estão traçadas na Lei nº 5.764/1971.

O sétimo – e último – princípio cooperativista é o princípio do interesse pela comunidade. Esse princípio destaca que as cooperativas devem trabalhar para o desenvolvimento sustentado das suas comunidades, mediante políticas aprovadas pelos seus membros.

Desta forma, é possível identificar o movimento cooperativo como grande agregador do prisma da função social da propriedade e da empresa, na medida em que realiza a atividade econômica com preponderância de melhora da qualidade de vida de seus associados, funcionários e com uma preocupação central com o desenvolvimento sustentável das regiões onde a atividade está inserida (ALVES, 2017).

O Cooperativismo, em si, é um movimento que está intimamente relacionado ao desenvolvimento sustentável, tendo em vista que está voltado para a realização de uma economia humanizada, cujo valor maior reside no indivíduo, antecedendo ao capital, com nítida conciliação entre solidariedade e individualidade.

É importante ressaltar que os princípios cooperativistas, com o passar dos anos foram estabelecidos dentro das legislações dos países que traçam normas gerais sobre o cooperativismo[4], ofertando assim a força necessária para a compreensão de sua aplicação. No Brasil, tanto a Lei nº 5.764/1971 - Lei Geral do Cooperativismo -, como o Código Civil brasileiro de 2002, trazem entre nas características gerais do cooperativismo essa inserção dos princípios correlacionados.

 

 


REFERÊNCIAS

ALVES, Giselle Borges. Poder compensatório, função social e concorrência: um olhar individualizado sobre o cooperativismo. In: Constituição, Empresa e Mercado. Ana Frazão (Org.). Faculdade de Direito-UnB, 2017, pp. 69-93.

BRASIL. Lei nº 5.764 de 16 de dezembro de 1971Define a Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades cooperativas, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5764.htm>. Acesso em 20 fev. 2021.

 _______. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406compilada.htm>. Acesso em 20 fev. 2021.

CENZI, Nerii Luiz. Cooperativismo: desde às origens ao projeto de lei de reforma do sistema cooperativo brasileiro. 1. ed. (2009), 1ª reimpr. Curitiba: Juruá, 2011.

MEINEN, Ênio; NERCOLINI DOMINGUES, Jefferson; DOMINGUES, Jane Aparecida Stefanes. Aspectos jurídicos do cooperativismo. Porto Alegre: Editora Sagra Luzzatto, 2002.

NAMORADO, Rui. O mistério do cooperativismo: da cooperação ao movimento cooperativo. Coimbra: Almedina, 2013.

ORGANIZAÇÃO DAS COOPERATIVAS BRASILEIRAS (OCB). O que é cooperativismo?. Somos Cooperativismo. Disponível em: < http://www.somoscooperativismo.coop.br/o-que-e-cooperativismo>. Acesso em: 20 fev. 2021.

PINHO, Diva Benevides. Economia e cooperativismo. São Paulo: Saraiva, 1977.

STÖBERL, Paulo Roberto. Conceito de sociedade cooperativa. In: Sociedades cooperativas. Alfredo de Assis Gonçalves Neto (coord). 1. ed. São Paulo: Lex, 2018, pp. 25-56.

 

 



[1] Paulo Roberto Stöberl (2018, p. 25) é um dos pesquisadores que ressalta a importância de compreender a distinção entre cooperativismo e cooperativa, informando que o cooperativismo é “um conjunto de valores orientativos de ação individual e também uma doutrina de sistema econômico e social” e a cooperativa, nada mais é, que “o braço econômico deste sistema”.

[2] Sobre os princípios cooperativistas e dados atuais do cooperativismo no Brasil e no mundo, acesse a página da Organização das Cooperativas Brasileiras – OCB: <http://www.somoscooperativismo.coop.br/o-que-e-cooperativismo>.

[3] Conforme estabelecido no Art. 4º, inciso VII da Lei nº 5.764/1971.

[4] Em um próximo texto serão feitas algumas considerações sobre as normas do cooperativismo e a correlação dos princípios com as características traçadas na legislação.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

STF conclui que direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição Federal



Por decisão majoritária, nesta quinta-feira (11), o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu que é incompatível com a Constituição Federal a ideia de um direito ao esquecimento que possibilite impedir, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos em meios de comunicação. Segundo a Corte, eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, com base em parâmetros constitucionais e na legislação penal e civil.

O Tribunal, por maioria dos votos, negou provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 1010606, com repercussão geral reconhecida, em que familiares da vítima de um crime de grande repercussão nos anos 1950 no Rio de Janeiro buscavam reparação pela reconstituição do caso, em 2004, no programa “Linha Direta”, da TV Globo, sem a sua autorização. Após quatro sessões de debates, o julgamento foi concluído hoje, com a apresentação de mais cinco votos (ministra Cármen Lúcia e ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Luiz Fux).

Solidariedade entre gerações

Ao votar pelo desprovimento do recurso, a ministra Cármen Lúcia afirmou que não há como extrair do sistema jurídico brasileiro, de forma genérica e plena, o esquecimento como direito fundamental limitador da liberdade de expressão “e, portanto, “como forma de coatar outros direitos à memória coletiva”. Cármen Lúcia fez referência ao direito à verdade histórica no âmbito do princípio da solidariedade entre gerações e considerou que não é possível, do ponto de vista jurídico, que uma geração negue à próxima o direito de saber a sua história. “Quem vai saber da escravidão, da violência contra mulher, contra índios, contra gays, senão pelo relato e pela exibição de exemplos específicos para comprovar a existência da agressão, da tortura e do feminicídio?”, refletiu.

Ponderação de valores

No voto em que acompanhou o relator, ministro Dias Toffoli, pelo desprovimento do RE, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a liberdade de expressão é um direito de capital importância, ligado ao exercício das franquias democráticas. No seu entendimento, enquanto categoria, o direito ao esquecimento só pode ser apurado caso a caso, em uma ponderação de valores, de maneira a sopesar qual dos dois direitos fundamentais (a liberdade de expressão ou os direitos de personalidade) deve ter prevalência. “A humanidade, ainda que queira suprimir o passado, ainda é obrigada a revivê-lo”, concluiu.

Exposição vexatória

Por outro lado, o ministro Gilmar Mendes votou pelo parcial provimento do RE, acompanhando a divergência apresentada pelo ministro Nunes Marques. Com fundamento nos direitos à intimidade e à vida privada, Mendes entendeu que a exposição humilhante ou vexatória de dados, da imagem e do nome de pessoas (autor e vítima) é indenizável, ainda que haja interesse público, histórico e social, devendo o tribunal de origem apreciar o pedido de indenização. O ministro concluiu que, na hipótese de conflito entre normas constitucionais de igual hierarquia, como no caso, é necessário examinar de forma pontual qual deles deve prevalecer para fins de direito de resposta e indenização, sem prejuízo de outros instrumentos a serem aprovados pelo Legislativo.

Ares democráticos

O ministro Marco Aurélio também seguiu o relator. A seu ver, o artigo 220 da Constituição Federal, que assegura a livre manifestação do pensamento, da criação, da expressão e da informação, está inserido em um capítulo que sinaliza a proteção de direitos. “Não cabe passar a borracha e partir para um verdadeiro obscurantismo e um retrocesso em termos de ares democráticos”, avaliou. Segundo o ministro, os veículos de comunicação têm o dever de retratar o ocorrido. Por essa razão, ele entendeu que decisões do juízo de origem e do órgão revisor não merecem censura, uma vez que a emissora não cometeu ato ilícito.

Fato notório e de domínio público

Para o presidente do STF, ministro Luiz Fux, é inegável que o direito ao esquecimento é uma decorrência lógica do princípio da dignidade da pessoa humana, e, quando há confronto entre valores constitucionais, é preciso eleger a prevalência de um deles. Para o ministro, o direito ao esquecimento pode ser aplicado. Mas, no caso dos autos, ele observou que os fatos são notórios e assumiram domínio público, tendo sido retratados não apenas no programa televisivo, mas em livros, revistas e jornais. Por esse motivo, ele acompanhou o relator pelo desprovimento do recurso.

Não participou do julgamento o ministro Luís Roberto Barroso, que declarou sua suspeição, por já ter atuado, quando era advogado, em outro processo da ré em situação parecida com a deste julgamento.

Tese

A tese de repercussão geral firmada no julgamento foi a seguinte:

“É incompatível com a Constituição Federal a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social – analógicos ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais, especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral, e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e civel”.

EC/CR//CF


Notícia original no site do STF (clique aqui)


sábado, 23 de janeiro de 2021

ASPECTOS PRÁTICOS E JURÍDICOS SOBRE A CONSTITUIÇÃO DE COOPERATIVAS

 

Giselle Borges Alves

Professora, advogada e servidora pública

Mestre em Direito pela Universidade de Brasília (UnB)

 

As cooperativas possuem grande importância no contexto humano, social e de diminuição das desigualdades, além de representarem importante componente para o desenvolvimento econômico brasileiro. Amoldam-se aos objetivos da República, conforme estabelecidos pela Carta Política de 1988, sobretudo por promoverem o trabalho humano como aspecto primordial de um capitalismo mais sustentável em todos os sentidos.

No entanto, muitas vezes pairam dúvidas sobre como constituir uma cooperativa e quais seriam os atos formais necessários. Assim, com o intuito de esclarecer de forma simplificada os aspectos expostos na Lei nº 5764/1971, que traz a Política Nacional do Cooperativismo, abaixo seguem algumas notas importantes.

 

1. Atos formais de constituição

 

Podemos definir alguns caminhos para a constituição e formalização das atividades de um empreendimento cooperativo, da seguinte forma:

1º) Reunião de todos os interessados na constituição da cooperativa: inicialmente, é pressuposto necessário que exista um número mínimo de associados para a constituição da cooperativa (20 membros conforme a Lei nº 5.764/1971 ou 07 membros em se tratando de cooperativa de trabalho, conforme a Lei nº 12.690/2012). Os interessados devem se reunir – ainda informalmente – e decidir questões preliminares como forma da cooperativa, objeto social, termos do estatuto, como se dará a organização, entre outros aspectos relacionados a gestão do empreendimento.

2º) Convocação dos interessados para a Assembleia Geral de Constituição: após reunir os interessados e decidir as questões prévias anteriormente informadas, estes devem se reunir em uma Assembleia Geral de Constituição, que será a primeira assembleia formal da cooperativa. Todos os interessados devem ser convocados para participar dessa assembleia com antecedência mínima de 10 (dez) dias.

A publicação dessa convocação deve seguir o que está estabelecido no artigo 38, §1º da Lei 5764/71, com as devidas adaptações, posto que é a primeira assembleia da cooperativa, e a norma traz os aspectos gerais que devem ser obedecidos por todas as assembleias, desde a primeira até as subsequentes após a criação da cooperativa.

Assim, o edital de convocação deve ser afixado em locais frequentados pelos pretensos associados do empreendimento, bem como também devem ser publicados em jornal local ou por meio de circulares. O objetivo da norma é ofertar a maior publicidade possível à realização da assembleia, para que todo os interessados tenham ciência da sua realização.

3º) Reunião dos interessados na Assembleia Geral de Constituição: uma vez convocados os interessados, será realizada a Assembleia de Constituição em que se deve deliberar sobre a constituição da cooperativa, a aprovação do Estatuto e a eleição dos cooperados que irão compor o Conselho de Administração, Conselho Fiscal e Diretoria.

É sempre importante que todos os membros sejam informados sobre os aspectos relacionados ao desempenho das atividades nos órgãos que compõem a cooperativa.

4º) Elaboração do Estatuto Social: conforme visto anteriormente, o estatuto da cooperativa deve ser aprovado na assembleia de constituição. Assim, é importante que nele esteja incluso o objeto social, bem como as regras que nortearão as atividades das cooperativas e seu relacionamento com os cooperados.

5º) Arquivamento dos atos constitutivos da sociedade: após a finalização da Assembleia Geral de Constituição com todas as aprovações necessárias, a ata da assembleia juntamente com o Estatuto Social são os atos que devem ser arquivados na Junta Comercial da localidade onde ela funcionará. Apenas após o arquivamento a cooperativa poderá adquirir personalidade jurídica.

6º) Registro da cooperativa: outro aspecto importante da constituição das cooperativas é o registro perante à OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras) ou na entidade estadual correspondente. Essa exigência está contida no art. 107 da Lei nº 5.764/1971).

É importante esclarecer que as cooperativas possuem representação de todos os segmentos de suas atividades, tanto a nível nacional, como em todos os Estados da Federação e no Distrito Federal. Em Minas Gerais, por exemplo, esta entidade é a OCEMG – Organização das Cooperativas do Estado de Minas Gerais.

Uma vez seguido este caminho e realizados todos os arquivamentos e registros, sem esquecer das licenças de funcionamento, inclusive perante os órgãos ambientais, e mediante obtenção dos alvarás e autorizações estaduais e municipais, conforme o ramo cooperativo e o desempenho das atividades, a cooperativa estará autorizada a iniciar suas atividades.

 

2. Aspectos específicos da denominação social

 

As sociedades cooperativas, como um tipo sui generis de sociedade, podem atribuir responsabilidade limitada ou ilimitada aos associados, conforme dispuser seu estatuto. Além disso, o nome comercial da sociedade deve constituir-se em denominação social, sendo obrigado o uso da expressão “cooperativa” em sua denominação, conforme dispõem os artigos 5º caput, 15 inciso I, 21 inciso I, todos da Lei nº 5.764/1971 e o art. 1.159 do Código Civil de 2002.

Em relação as cooperativas que desejam atuar no ramo crédito, é importante ressaltar que é vedado às cooperativas de crédito o uso da denominação “banco”, conforme estabelecido expressamente no parágrafo único do Art. 5°, Lei nº 5.764/1971. As cooperativas de crédito são instituições financeiras que pertencem ao sistema financeiro nacional, mas para elas são aplicadas normas regulatórias específicas, diversas das normas aplicáveis em caráter geral aos bancos.

É importante ressaltar, ainda, que de acordo com a Lei nº 5764/1971, a responsabilidade dos sócios da cooperativa pode ser limitada ou ilimitada. Caso seja limitada, a sociedade cooperativa poderá acrescentar em sua denominação social a expressão “Ltda”.

 

3. Considerações finais

 

A constituição de cooperativas apesar de muita similaridade com a constituição de sociedades de natureza empresária, encontra na Lei Geral – 5.764/1971 – algumas especificidades que devem ser obedecidas para que não sejam confundidas com empresas convencionais.

As normas jurídicas ofertam ao cooperativismo uma regulação diferenciada, em alguns casos mais protetiva do que para empresas convencionais, e a identificação correta de uma cooperativa, que adere aos princípios fundamentais deste movimento secular, inicia desde os seus primeiros passos. Por este motivo, é sempre importante proceder corretamente com os registros e a obtenção das licenças necessárias ao funcionamento, evitando problemas com órgãos reguladores e também possibilitando que as cooperativas, após constituídas regularmente, tenham acesso às prerrogativas fiscais, tributárias e de acesso a crédito, tão importantes ao seu desenvolvimento.

 

REFERÊNCIAS


BRASIL. Lei nº 5.764 de 16 de dezembro de 1971. Define a Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades cooperativas, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5764.htm>. Acesso em 23 jan. 2021.


 ______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em 23 jan. 2021.

 

______. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406compilada.htm>. Acesso em 23 jan. 2021.

______. Lei 12.690 de 19 de julho de 2012. Organização e o funcionamento das Cooperativas de Trabalho; institui o Programa Nacional de Fomento às Cooperativas de Trabalho - PRONACOOP; e revoga o parágrafo único do art. 442 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12690.htm>. Acesso em: 23 jan. 2021.

 

 

 

domingo, 10 de janeiro de 2021

Itaipu Binacional: supranacionalidade definida pela STF

 

O STF em decisão nas Ações Cíveis Originárias 1904, 1905 e 1957 deliberou pela natureza jurídica supranacional da Itaipu Binacional, afirmando que a hidrelétrica não integra a administração pública brasileira. De acordo com a Corte Suprema Brasileira, prevalece o Tratado firmado entre Brasil e Paraguai, como norma regente das relações e contratos firmados pela Itaipu Binacional.

Segue abaixo a notícia sobre a decisão. Para mais informações, recomenda-se a leitura das decisões das ações originárias.

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Itaipu Binacional se submete apenas a tratado firmado entre Brasil e Paraguai

A natureza transnacional afasta a possibilidade de a hidrelétrica integrar a administração pública brasileira.

Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a natureza jurídica da Itaipu Binacional impede sua submissão à legislação brasileira, devendo prevalecer o tratado firmado em 26/4/1973 entre Brasil e Paraguai para o aproveitamento hidrelétrico dos recursos hídricos do Rio Paraná. A decisão foi tomada no julgamento conjunto das Ações Cíveis Originárias (ACOs) 1904, 1905 e 1957, em sessão virtual do Plenário finalizada em 4/9, nos termos do voto do relator, ministro Marco Aurélio. Nas ações, o Ministério Público Federal (MPF) pretendia a aplicação à Itaipu da legislação nacional sobre hidrelétricas para tomada de contas, contratação de obras, serviços e bens e gestão de pessoal. Mas, de acordo com o relator, nos termos do tratado constitutivo da empresa, "não há como fugir à configuração supranacional da hidrelétrica, no que afastada qualquer tentativa de tê-la como integrante da administração pública brasileira".


Licitações e concurso público

Na ACO 1904, o relator observou que os contratos de Itaipu para a execução de obras, serviços, compras, locações e alienações se submetem à Norma Geral de Licitação, aprovada pelo Conselho de Administração da Itaipu Binacional mediante a Resolução RCS – 002/2001. A norma estabelece, salvo exceções, que todos os procedimentos de contratação de serviços e afins são precedidos por licitação, destinada a selecionar a proposta mais vantajosa para a empresa.

Na ACO 1957, o MPF defendia que Itaipu pertence à administração pública brasileira e deveria seguir os preceitos constitucionais em relação à seleção de empregados por concurso públicos. No entanto, o relator afirmou que não se aplica à empresa o artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, mas o artigo XX do tratado constitutivo. Ele observou que não consta do instrumento internacional firmado entre Brasil e Paraguai "nenhuma menção à necessidade de seleção de empregados mediante concurso público" e que consulta ao sítio eletrônico da hidrelétrica, em 11/7/2017, revelou a realização de 19 processos seletivos entre 2005 e 2014.


Controle externo

Sobre o objeto da ACO 1905, que pretendia atribuir ao Tribunal de Contas da União (TCU) poder de controle externo sobre contas nacionais de Itaipu, o ministro Marco Aurélio reafirmou o caráter supranacional da empresa. Segundo o relator, a Constituição Federal inciso V do artigo 71) dispõe que o controle externo a ser exercido pelo TCU sobre contas nacionais de empresa supranacional, com capital social da União, deve ser feito nos termos do tratado que a constituiu. No caso de Itaipu, o tratado e seus anexos, segundo o relator, não deixam dúvidas da natureza unitária da diretoria da empresa, sendo incabível qualquer tentativa de cisão. "Itaipu Binacional é ente único, indivisível", afirmou.

O ministro Marco Aurélio afirmou, ainda, que eventual fiscalização pelo TCU só poderá ocorrer nos termos acordados com a República do Paraguai e materializados em instrumento diplomaticamente firmado entre os dois Estados soberanos. O ministro acrescentou que, nesse sentido, a Procuradoria-Geral da República (PGR) informou a criação da Comissão Binacional de Contas, competente para exercer o controle externo.


Competência do STF

A competência do STF para julgar ações envolvendo interesse da Itaipu Binacional frente à União ou a Estado estrangeiro foi decidida pelo Plenário no julgamento da Reclamação (Rcl) 2937, ajuizada pela República do Paraguai. Nela, o governo paraguaio, por meio de medida liminar deferida pelo ministro Marco Aurélio, conseguiu suspender a tramitação de ações civis públicas ajuizadas contra Itaipu na Seção Judiciária do Paraná.


Igualdade de condições

Há 47 anos, Brasil e Paraguai firmaram um tratado para o aproveitamento dos recursos hídricos do Rio Paraná, pertencentes, em condomínio, aos dois países. Esse tratado foi instituído em igualdade de condições, direitos e obrigações. Nascia, ali, a entidade binacional denominada Itaipu, constituída pela Eletrobras e pela paraguaia Ande, com igual participação no capital, regida pelas normas estabelecidas no tratado, no estatuto e nos demais anexos. As normas que cuidam da matéria foram incorporadas ao sistema jurídico brasileiro por meio do Decreto Legislativo 23/1973 e do Decreto 72.707/1973.

Segundo o ministro Marco Aurélio, o quadro, no que tange aos negócios jurídicos realizados pela hidrelétrica, "não é de anomia”, e a empresa, desde sua constituição, “tem atuado como previsto nos documentos que a regem". Por unanimidade, o Plenário julgou improcedentes os pedidos do MPF nas três ações.


Fonte: STF (link)

Decisão STJ - Imóvel não substitui depósito em dinheiro na execução provisória por quantia certa

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